Brasil (im)potência

Lemos: "Está na hora de aplicar uma ducha fria na ideia do país como superpotência"

por Ronaldo Lemos em

Está na hora de aplicar uma ducha fria na ideia do país como superpotência, aproveitar o momento para refletir sobre uma transformação do nosso modo de vida e fugir do tipo de desenvolvimento que leva à obesidade

Autoestima é essencial. Por tempo demais vivemos com um penoso complexo de viralata e a ideia de que “o Brasil não é um país sério”. Com o salto dos últimos anos, muita gente voltou a acreditar no país. E, como qualquer economista sabe, essa crença em si é capaz de gerar prosperidade. Traz empreendedorismo, confiança e estabilidade.

Mas excesso de autoestima também faz mal. Vira uma força paralisante. Começam a surgir momentos de delírio coletivo em que o Brasil figura como superpotência, líder global. Em outras palavras, parece que já está tudo certo e não precisamos fazer mais nada, já que estamos predestinados ao sucesso.

Essa ilusão é perigosa e vem sendo alimentada das mais diversas formas. Quando o país tornou-se a sexta economia do mundo, ultrapassando a Inglaterra (a fonte é um estudo do CEBR, Center for Economics and Business Research), a maioria das notícias simplesmente omitiu a segunda parte da pesquisa. O estudo diz que em 2020 o Brasil continuará na mesmíssima posição. E mais: vai ser ultrapassado pela Índia e pela Rússia, ficando na lanterna no Brics.

A projeção faz sentido. É só olhar as principais exportações do país: matériasprimas como ferro, soja, açúcar, petróleo e café. Se por um lado faz sentido aproveitar vantagens comparativas, por outro a lista aponta na direção do século 19. É um modelo que gera dependência enorme da China. E pior: não há sinais de que o bom momento econômico esteja sendo aproveitado para repensar o modelo de desenvolvimento do país, ampliando a competitividade de outras áreas e fomentando atividades de maior valor agregado e inovação (inclusive tecnológica). Por ora, estamos apenas curtindo a onda. E isso costuma terminar mal. Basta perguntar aos nossos vizinhos argentinos, que estiveram em situação parecida no começo do século 20.

Petróleo é maldição

Para ser superpotência é preciso um conjunto institucional complexo. O poder dos Estados Unidos e da Europa emana de instituições muito mais amplas do que se supõe lendo o noticiário sobre a crise atual: universidades, infraestrutura, capacidade de inovação, desburocratização. São áreas que carecem de investimentos e de uma visão mais estratégica por aqui. Apostar que o pré-sal em si serve de garantia de desenvolvimento é um erro. Petróleo é também maldição: pode trazer dependência, perda de competitividade, desindustrialização e corrupção.

Está na hora de aplicar uma ducha fria na ideia do “Brasil potência”. Este é o momento em que o país mais precisa de um salto no seu modelo de desenvolvimento, não se acomodar e incluir na sua pauta transformações econômicas e de modos de vida, igualmente essenciais. Fugir da ideia do desenvolvimento que leva à obesidade. Aí sim abriremos caminho para liderar.

*Ronaldo Lemos, 34, é diretor do Centro de Tecnologia da FGV-RJ e fundador do site www.overmundo.com.br. Seu e-mail é rlemos@trip.com.br

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