por Carol Ito

Baterista que se tornou referência no rap nacional, Sorry Drummer apresenta no show Hip Hop Origens uma revisão de clássicos do hip hop

Luis Roberto Julião, 44, mais conhecido como Sorry Drummer, é um cara muito educado. Foi na Inglaterra, onde morou entre 1999 e 2002, que ele adquiriu a mania de pedir desculpas. “Lá dizem sorry pra tudo e falavam que eu era muito cortês. Mas eu sou assim falando em português também”, conta. Os amigos começaram a brincar que ele não estava mais na gringa e que não precisava agir assim, mas isso faz parte de sua personalidade, tanto é que virou nome artístico.

Sorry foi criado na Vila Matilde, zona leste de São Paulo. Tentou se formar na faculdade de química, mas a falta de grana fez com que abandonasse o curso. Na época, surgiu uma oportunidade de emprego na Inglaterra, que não tinha nada a ver com música, mas que abriu caminho para que ele conhecesse muitos artistas de rua e comprasse a sua bateria. “Quando eu voltei para o Brasil, comecei a ligar para alguns amigos, como o Kamau, o DJ Marco, e falei: “Que tal se a gente montasse uma banda de rap?”. 

Hoje é mais comum que rappers se apresentem acompanhados de banda e DJ, mas, no início dos anos 2000, ainda era algo mais ligado ao mainstream. Sorry fez parte de um grupo de músicos que começou a incorporar esse formato à cena independente. Seus primeiros passos carregavam muito do improviso, em jam sessions com amigos, em que ele criava batidas na bateria ao mesmo tempo em que o DJ fazia o mesmo a partir de samples. “Não via isso nem na Inglaterra na época. O primeiro show que eu ganhei um cachezinho foi com o KL Jay [DJ dos Racionais MCs], no Clube da Cidade”, lembra o músico. 

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Hoje, ele é uma referência do rap nacional e, nos dias 12 e 26 de outubro, Sorry Drummer volta à vitrine da Galeria Olido com o projeto Hip Hop Origens, um show em que ele revisa clássicos do rap e do soul, desde os anos 70, repaginados por ele e pelo DJ Erick Jay (do programa Manos e Minas), com produção de Silvera e Slim Rimografia como mestre de cerimônias. “Eu estava em casa ouvindo hip hop dos anos 90 e, conversando com o meu amigo Luciano Rocha, do programa de rádio Black Songs, falei para a gente contar a história do hip hop em versão acústica”, lembra Sorry. Com isso em mente, chamou o DJ Erick Jay, dono de uma coleção respeitável de clássicos de todas as épocas, para riscar os discos. Aí é só esperar que lá vem samples de James Brown, Tupac, Notorious B.I.G., Black Juniors,  Thaíde e Racionais Mcs.

Central Acústica

Entre os bateristas, Sorry tem como ídolos Questlove, da banda The Roots, formada na década de 80. “Ele foi o primeiro a dar o pontapé nesse lance de banda voltada pro hip hop, não existia isso na América”, conta. No Brasil, os ídolos são Wilson das Neves, baterista, cantor e compositor de samba, e Milton Banana, que acompanhou vários ícones da bossa nova, como Baden Powell, Sérgio Mendes e João Gilberto.

O sonho de Sorry de ter uma banda de rap se concretizou em 2002, com a criação da Central Acústica, formada por ele na batera, Kamau como MC, DJ Marco (que hoje se apresenta com a Céu), DJ Ajamu, DJ Negrito, o guitarrista Guilherme Scabin, o baixista Paulo Sérgio de Oliveira e o tecladista Pedro Semeghini. A banda se apresentava na vitrine da Galeria Olido, um dos pontos de encontro do rap em São Paulo, onde até hoje rolam muito eventos ligados à cultura hip hop. “Eu tinha que improvisar durante três horas. Para cada MC eu mandava um beat diferente”, conta.

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A ideia do Central era revelar novos talentos, já que em alguns momentos o microfone era aberto para quem quisesse mandar uma rima. “Como tocávamos aqui no centro, tinha MCs dos EUA, de Cuba, Argentina, Canadá. Eles vinham pra uma festa com banda tocando e open mic”. Muitos rappers importantes passaram por essas apresentações do Central Acústica: “Nessas jam sessions surgiram Criolo, Emicida, Rashid, Nocivo, Stefanie, Arnaldo Tifu, Slim Rimografia, Parteum, Projota, Rincon Sapiência, Marechal, entre outros. Todos os que chegaram no mercado passaram por lá”, explica Sorry.

Nas apresentações da Central, ele conheceu o produtor Silvera, 40, que seria parceiro em projetos futuros. Silvera é conhecido por seus trabalhos no gênero R&B e gospel e se diz suspeito para falar da importância da Central Acústica para o rap nacional. “Muita gente passou a acreditar que era possível. Você via o moleque no canto, quietinho, daqui a pouco o cara pegava o microfone e se transformava. Tinha coisa boa, coisa ruim, era anarquia”, lembra o produtor.

Encontro de gerações

Em 2011, Sorry lançou seu primeiro disco, o Sorry Drummer & Friends Vol. 1 (disponível para download), que foi lançado pelo selo Gueropa, no Brasil, e pelo selo japonês P-VINE, que também lançou Ed Motta. “Eles gostaram do som e falaram ‘isso tem chance de entrar no Japão’”. O disco é um verdadeiro catálogo de artistas do rap e conta com participações de Slim Rimografia, Kamau, Rincon Sapiência, Arnaldo Tifú, Replife, Mr. Reed, Patricia Marx, Valmir Nascimento, Summer Azul, Herbert Medeiros, Robinho Tavares e Filiph Neo.

Em 2016, ele lançou o Sorry Drummer & Friends Vol. 2, também pelo Gueropa Music, com participações de rappers como Slim Rimografia, Rashid, Rincon Sapiência, Síntese e os internacionais Akua Naru, Trista Eaden, Chris Broadnax e Ngoma Mjumbe. Entre as mulheres que participam, estão quatro das sete que hoje formam o grupo Rimas e Melodias: Tássia Reis, Tatiana Bispo, Drik Barbosa e Stefanie, que juntamente com Karol de Souza, Alt Niss e a DJ Mayra Maldjian lançaram o primeiro disco em setembro.

Silvera acredita que os discos são resultado da troca experiências: “Os novos sempre trazem coisas que a gente não tá sacando. E a gente mostra coisas que eles não tinham ideia que existia. O cara vem com uma novidade e a gente sabe que é sampleado de algum som antigo. Isso só enriquece”.

Créditos

Imagem principal: Divulgação / Felipe Barros

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