BoxeAprendi a lutar boxe com vários amigos, aprisionados como eu, que fui encontrando enquanto cumpria minha pena. Mas o Natal foi quem mais me ajudou a desenvolver-me no esporte. Batia muito e sem dó, me obrigando a criar uma enorme capacidade de defesa. Fazer frente a ele, que tinha cerca de 20 quilos a mais e quase um palmo a mais que eu de altura, além de anos de treinamento em academias, era um desafio e tanto. Apanhei, apanhei, até que tive a intuição: faltava atenção. Percebi que apanhava mais quando estava mais disperso. Quando entendi e desenvolvi a capacidade de concentração, me senti seguro no quadrado do ringue e para lidar com a vida mais coerentemente, sem medo.Quem esta ali no quadrado ou no octogonal, para ter uma chance de ganhar, precisa se esquecer da vida. Esquecer tudo, limpar a mente de passado, presente e até da esperança no futuro. Estar absolutamente concentrado naquele átimo de segundo para estar consciente para onde vai a mão do oponente. Olho no olho, guerra de olhos; desconcentrou, tomou e tombou. É muito mais psicologia e estudo do adversário que violência ou agressividade. Mesmo por isso, no passado, o boxe era chamado de “a nobre arte”. A partir da consciência de para vai as mãos do adversário, montamos uma linha de defesa e posterior contra-ataque. Quem ganha não é o mais forte e sim o mais centrado na luta. A concentração é quase tudo em todos os esportes, mas no boxe é a fonte da vitória. O meu esforço, a partir dessa descoberta, sempre foi para ignorar passado, presente e futuro e me prender ao instante no máximo que fosse capaz. As circunstâncias me obrigavam; fazia parte da sobrevivência. Caso pensasse em passado ou futuro, estaria perdido, como meus três companheiros de crime e processos. Um se enforcou em uma cela-forte e os outros dois ficaram lesados, estupidificados. O passado era tenebroso, carregado de culpas e dores. O futuro não havia; estava condenado a mais de 100 anos de prisão. Até o presente me era vedado viver. A vida presente me era passada em informações de 3ª (as cartas eram censuradas) ou 4ª mãos. Restava-me, para continuar lúcido, o momento em que estava vivendo, mesmo que fora do tempo. Depois fui saber que aquela era lição básica do Zen budismo. Fazer tudo com o máximo de concentração no que se esta fazendo. Estar presente no presente. Somente dessa maneira conseguimos crescer: fazer tudo com o máximo de perfeição que somos capazes. Viver somente o que se esta vivendo. Parece redundância, mas há uma sabedoria milenar nessa informação. A preguiça, o relaxamento e a falta de vontade, tornaram-se meus inimigos viscerais. E somente assim consegui progredir. **Luiz Mendes 25/03/2014.
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Trip/Esporte/Comportamento
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