A não-resignação é sadia
Coletivo DAR
Tentaram durante toda minha vida, enfiar isso de resignação pela minha guela abaixo. As religiões e as normas sociais pregavam que a pessoa devia aceitar as coisas como elas eram. Felicidade não era desse mundo. Aqui era lugar de sofrimento e dor. O paraíso viria depois da morte, na medida exata da resignação de cada um à sua “sorte”. Óbvio que isso só favorecia os donos do poder.
Desde muito pequeno não consegui engolir essa dose amarga de mentira. Mesmo com meu pai trabalhando (quando não estava bêbado e desempregado), ainda assim passávamos necessidade. Carne de vaca só se comia uma vez por mês, no dia do pagamento. Aos domingos tinha a macarronada ao molho de frango. O resto dos dias era arroz e feijão com ovo ou berinjela frita. O aluguel era nosso fantasma: vivíamos sob ameaça de despejo. Minha mãe tremia só de pensar que iríamos para baixo da ponte caso não conseguisse pagar o aluguel.
Jamais me resignei a coisa alguma. Revoltei-me logo cedo contra aquela condição que me barrava de viver de verdade como todo mundo. Por conta disso e os sérios enganos cometidos, cumpri mais de 30 anos de prisão. E mesmo assim, continuei a não aceitar nada como definitivo. Para mim resignar seria me condenar a um suicídio permanente. Acho que só a morte realmente define as coisas. Até lá, estou na luta, cheio de vontade de aproveitar cada migalha de chance que obtiver.
Por conta disso que fiquei muito feliz, ao ponto de deixar escorrer algumas lágrimas pela cara quando comecei a ver e acompanhar as ações desse Coletivo DAR (o DAR é significativo: vem de “Desobstruindo A Razão”). Antes houve aqueles estudantes do Passe Livre, Lembram? Eles sabiam que não conseguiriam abaixar o preço da passagem. Era decreto. Mas era um símbolo (nem todos se calaram), a indignação e o começo de uma luta. Apanharam bem, entraram na borrachada da PM, como o Coletivo DAR na proibida Marcha da Maconha. Depois veio a Marcha da Liberdade, também proibida judicialmente. Mas como proibir o povo que é dono da rua de estar em suas próprias ruas? E aconteceu linda e pacificamente.
Senti esse grupo como um longo respirar depois de tanto tempo sem ninguém sequer se mostrar indignado. Um alívio enorme, uma esperança profunda me envolve só pelo simples comentar aqui, agora. Eu estava certo desde pequeno. Errei na pegada e acabei me dando mal. Mas estava certo quanto ao princípio. Como é sadio não se resignar! Meus parabéns pessoal do Coletivo DAR, estou com vocês!
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Luiz Mendes
03/06/2011.