A cerca virtual

por Luiz Alberto Mendes em

Prisão sem muros

 

Observando as disposições das coisas e as atitudes daqueles que mexem os cordéis para que as marionetes políticas conduzam o país, chego à conclusão de que querem chegar a um ideal: uma prisão sem muros. Assim, só para citar um exemplo, do rio Pinheiros para o fundão da periferia da cidade. A divisória não é exata, mas dá para se ter uma idéia do que quero dizer. Os cidadões-prisioneiros não têm consciência da prisão virtual, por assim dizer, em que sobrevivem. Mesmo por isso, sequer lhes passa pela cabeça escapar.

O consumismo , a animação e a diversão, o pão e o circo romanos, já estão na periferia. Os shopping centers, as casas de shows, danças e mesmo as boates estão nos bairros distantes. Claro que oferecem um produto sem a mesma qualidade dos shoppings e casas de shows centrais e, mais barato. Oferecem menos opções e vendem as marcas sem muita projeção comercial. Os hipermercados dentro desses shoppings oferecem uma variedade limitada. O povo já nem precisa atravessar o rio para participar do consumismo e se endividar até o pescoço.

Na periferia também tudo é público. Os hospitais, os postos de saúde, as escolas, os espaços sociais, parques, jardins, clubes, piscinas e até a segurança, são de uso público. E todos deficitários, com funcionários despreparados, sem competência para receber o povo (quando tem funcionários...) e meios de atendimento indignos de seus dependentes. As pessoas morrem, chegam a parir na porta dos hospitais e as escolas não conseguem ensinam nada; apenas passam os alunos de ano. O tal de INSS é burocracia tão desavergonhada que desestimula qualquer um a procurá-lo. As crianças da periferia não conseguiria se adaptar às escolas pagas. O que aprendem é muito abaixo de nível de ensino das escolas privadas. Nem banco há na periferia; as lotéricas cumprem a função bancária. Filas homéricas se postam na frente das casas lotéricas; as pessoas estão pagando carnês ou prestações das Casas Bahia.

Já depois do rio, há tanta segurança privada que chegam a congestionar as ruas de homens armados e uniformizados tipo para-militares. Possuem plano de saúde especial; hospitais com grandes especialistas, médicos e escolas particulares campeãs em aprovação de seus alunos.

As marcas mais sofisticadas só se apresentam nos shoppins centrais ou próximos aos jardins. Nesses lugares tem tudo do melhor, muita coisa importada, até frutas (que temos em abundância no país...) e verduras. Há ilhas de riqueza como os Tamborés, Alfavilles e os condomínios de luxo da vida. Concentram grandes shoppings e demais meios do mais alto consumo. Só se vê carro importado por ali. Eles têm idéias para fechar ruas e quadriláteros públicos com portarias e seguranças armados. Constante tramita na Câmara do município projetos dessa natureza. A seu modo, com medo, eles criam suas luxuosas prisões, mas nem por isso, menos prisão.

Há quem considere a favela ou o bairro pobre, o seu lugar de origem e fim. A "quebrada". Não se sentem bem depois do rio Pinheiros. Vão somente para trabalhar e voltam correndo para casa em ônibus super-lotados. Gostam mesmo é de ficar no espaço onde estão seus iguais. Estão convencidos que esse é seu lugar e que se saírem dali, talvez nem consigam voltar. Convencer as pessoas que elas foram enganadas é missão quase impossível. Parece mesmo que já vivemos uma prisão sem muros e que realmente nos ensinaram a gostar. Talvez seja por isso que às vezes tudo me parece tão caro, e eu tão barato.

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Luiz Mendes

07/05/2013.       

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