A Casa de Orações

por Luiz Alberto Mendes em

A Missa

 

Depois de cerca de 50 anos, sábado passado fui a uma missa. Não sou católico e nem tão pouco religioso. Alias, não gosto dos conceitos religiosos; eles me parecem muito mal arranjados. Mas fui à missa de sétimo dia do passamento de minha cunhada. Era uma homenagem, Silvia merecia e toda família foi. A Igreja era nova, bem iluminada e simples. Após o Padre dar início à missa, o clima emocional foi se densificando e eu mergulhei fundo, de olhos fechados, buscando a imagem da falecida para envolve-la em pensamentos afetuosos.

Meu ser se encheu da doce energia que a Igreja envolvia a todos presentes. Fiquei profundamente comovido observando a família toda ali reunida para aquela ultima despedida. Era uma família com diversas experiências religiosas, mas poucos católicos praticantes, com exceção da falecida. E nisso estava a beleza daquele culto; estávamos todos ali, respeitando a fé de nossa familiar, como uma forma de demonstrar o carinho que tínhamos por ela.

Fiquei pensando no homem pregado na cruz, ao fundo do altar. Lembrei suas palavras e a emoção acabou por me dominar completamente. Ninguém jamais disse: "vinde a mim, vós que estais sofrendo; eu vos aliviarei"; é incrível como essas palavras são mágicas, o quanto cada um de nós carece desse alívio. Elas caem como um orvalho, nos dessedentando e nos fazendo sentir o quão distante estamos de nós mesmos. Ou então: "aceite de mim o jugo, de mim que eu sou manso e humilde de coração". Da vontade de nos entregar a alguém assim doce que nos apascente como uma mãe sempre compreensiva... Não há condenação, não há castigo e nem perdão. É o sonho de ter um pai amoroso a nos olhar como fôssemos seus filhinhos... O Sermão do Monte tem uma grandiosidade que nunca ninguém nesse planeta foi capaz de nos transmitir. Por mais falseiem e tergiversem os homens, aquilo é uma luz a nos indicar o norte. "Amai-vos uns aos outros como eu os amei", e como seria isso? Que tipo de amor seria este? Provavelmente um amor de sacrifício, de renúncia de si mesmo em prol do outro. Jamais em minha vida fui tão feliz quanto o tempo em que frequentava um hospital para portadores do virus HIV, na Penitenciária do Estado. Ali aprendi que não há alegria maior do que dar a quem realmente necessita. O olhar satisfeito, o olhar agradecido, o olhar reconhecido e amoroso das pessoas é um alimento poderoso para uma alma conflitada como a minha. Por vezes saia de lá tão feliz e pleno que nem sentia, literalmente, o chão de concreto que pisava.

Uma pena sejamos tão pouco capazes. É triste constatar que estamos tão distantes de nos reconhecermos como irmãos, que nem os irmão de sangue são realmente irmãos de verdade. Pensei em nossa covardia e em nosso medo a construir nossos destinos. Como nos tornamos infelizes... Haveria esperanças de uma vida melhor para nós? Creio que sim, mas não individualmente como querem os pós-modernos. Ou nos salvaremos todos ou não se salvará ninguém. Um absurdo pensar que porque faz orações, frequenta igreja e faz alguma caridade, a pessoa esta salva. Salvar aqui no sentido de estar bem. Não creio que haja salvação noutro sentido, mesmo porque não considero que estejamos perdidos para sermos salvos. Estamos sim ignorantes e inscientes e só o conhecimento é salvação.

  Ao fim e ao cabo da missa, saímos todos e nos encontramos no lado de fora da Igreja. Havia um clima de alegria, de paz, um afeto tão profundo em cada um de nós que não conseguimos nos largar. Fomos quase todos para a casa da finada cunhada e por lá ficamos a conversar. Quando acabou a conversa, o prazer de ficarmos juntos era tão grande, que inventamos um jogo de cartas para prolongar ao máximo aquela satisfação. Nos separamos de madrugada, quando o sono já derrubava nossos olhos.

Acabei gostando muito da missa, ela nos unificou e sem dúvida nos trouxe a alegria, a paz e o amor que necessitávamos, tristes que estávamos pelo falecimento de nosso ente querido.

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Luiz Mendes

29/10/2013. 

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