A busca de entender quem somos

por Luiz Alberto Mendes em

Quem somos

 

Tenho uma idéia aproximada de quem vou me esforçando por ser e de quem venho sendo. Meus esforços nem sempre atingem minhas metas. Na verdade, os insucessos teimaram por serem mais frequentes até a algum tempo atrás. De um tempo a essa parte, até que não posso me queixar. Boa parte de meus projetos têm dado certo.

Hoje, por conta da idade (62 anos), apesar de que estou em forma (frequento academia e corro na rua), há limites até físicos para o que posso vir a ser ou ter. Embora pareça que os sonhos vão se encurtando com a idade, não é bem assim que acontece. Na verdade eles vão sendo ultrapassados, vencidos por outros que são cada vez mais fascinantes. Quando jovens os sonhos nos tomam de assalto. Não nos deixam opções: ou os atingimos, ou os atingimos. Mas quando vai avançando a idade, eles nos seduzem, nos encantam poeticamente, como a sereia ao marinheiro. É assim que vou me esforçando por ser escritor. Renunciei a tudo o mais. Não faço mais nada a não ser escrever, falar e ensinar sobre como escrever. Passo apertado com minhas responsabilidades, mas prefiro assim. Dinheiro não é tudo, apenas parte.

Quero ser um escritor renomado, alguém aceito como tal. Outro dia recebi uma crítica a meu ultimo livro que me deixou preocupado. O crítico dizia que ao pegar o livro e saber que sou egresso da prisão, já rejeitou. Dizia que ele luta contra o crime, contra quem faz mal aos outros, não podia ser favorável a quem já praticou e em sua gravidade máxima. É preconceito, mas plenamente compreensível. Porque é profissional, se obrigou a ler assim mesmo. E não é que gostou? E acabou por gostar muito, tanto que transcreveu várias poesias minhas em sua crítica. Não há maior elogio. Uma pessoa esta contra mim sem me conhecer porque em passado remoto, me envolvi com um grupo reprovável. Depois de ler o que escrevo me compreende, aceita e se convence que posso ser poeta, escritor, não é um grande reconhecimento? De alguma forma eu percebo que posso ser o que eu desejar. Claro, não vai dar para ser campeão de vale-tudo, atleta internacional, piloto de fórmula 1, ou vencedor da maratona nas Olimpíadas. A idade limita e é algo que não posso negar. Mas nunca quis ser nada disso... Agora um grande escritor, um intelectual respeitado, alguém a ser consultado, sempre quis ser. E ainda dá para atingir porque depende do espírito e não do corpo. Tenho mais de 40 anos de leituras e 13 anos como escritor. Escritor mesmo, aquele que vive do que escreve. Faço palestras e Oficinas de Leitura e Escrita (em setembro no SESC Santo André), porque os livros que escrevi me pautam para tais eventos.

Acredito seriamente que tudo é absolutamente compatível. Só fazemos, só sentimos, só vemos e pensamos a partir do que somos, do que fizemos de nós. Só enxerga bondade quem tem bondade dentro de si. Só vê arte quem tem a arte dentro de sua alma. Assim como só vê o mal quem já tem o mal dentro de si. Embora tenha cumprido tantos anos de prisão, em algumas coisas sou muito ingênuo. Por exemplo: no comércio já fui enganado inúmeras vezes. Comprei gato por lebre e levei na cabeça muitas vezes. Não faço dívidas, compro tudo a vista, não empresto dinheiro de ninguém, se tiver que pagar, pago sempre antes do vencimento, chego às reuniões e encontros quase meia hora mais cedo para não correr o risco de chegar atrasado. Sou extremamente honesto e correto com meus negócios, e sempre fui assim, jamais abusei da confiança de ninguém. Somente na hora do roubo fui ladrão. E, assim que percebi o mal que fazia, me livrei de mais esse problema em minha vida. Dizem que sou sistemático.

Estou calmo, pensando muito em fazer minha parte, em colaborar, compartilhar e viver com os outros. É como uma demorada doença da qual vou me curando e reabilitando para o resto de minha vida.

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Luiz Mendes

31/07/2014.  

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