Empreendedorismo possível
A homenageada pelo Prêmio Trip Transformadores Luiza Batista reflete sobre empreendedorismo feminino ao comparar sua jornada profissional à da neta
Pessoalmente, nunca tive que empreender. Hoje, estou com 65 anos e aposentada, mas durante boa parte da minha vida trabalhei em casas de família. Cheguei a atuar por um tempo como cobradora de ônibus, mas logo voltei ao trabalho doméstico. A partir dessa fase, sempre tive a carteira assinada. Embora eu hoje entenda que dentro de mim já havia um espírito rebelde, só fui me conscientizar sobre a minha posição dentro do mercado de trabalho e minha classe muitos anos depois, já aposentada.
Em 2006, voltei a estudar e me filiei ao sindicato, entidade que presidi três anos depois. Em 2016, durante o 11º Congresso Nacional de Trabalhadoras e Trabalhadores Domésticos, fui eleita presidenta da Fenatrad, Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas, função que ainda hoje exerço. Para mim, esse foi o momento mais marcante e especial da minha trajetória, nunca imaginei que pudesse chegar a essa posição.
Como dirigente sindical, tive a oportunidade de rodar o mundo em congressos e eventos para compartilhar a realidade das trabalhadoras domésticas do Brasil e conhecer as dores e dificuldades de mulheres na mesma condição em outros países. Passei por Bélgica, África do Sul, Argentina, Paraguai, Uruguai, Chile, Suíça. O meu trabalho frente à Federação é político, de articulação, e graças a minha posição posso falar do trabalho doméstico e das dificuldades que as companheiras enfrentam.
Mais que dar suporte nesse momento de crise, nossa função principal é lidar com o desrespeito dos empregadores aos direitos conquistados, lutar para a valorização do trabalho digno, registrado em carteira, e qualificar trabalhadoras domésticas de todo o país.
Questão de gênero
A vida das mulheres sempre foi mais difícil e essa máxima só se confirmou durante a pandemia, afinal mais mulheres que homens perderam seus empregos no último ano. Segundo o Dieese, as trabalhadoras domésticas viram 1,4 milhão de postos de trabalho evaporarem desde que a Covid-19 começou a se espalhar no Brasil. O desemprego no país foi ampliado durante a pandemia, mas a precarização do trabalho já era uma realidade desde antes.
Embora nunca tenha tido uma experiência como empreendedora, testemunhei, de muito perto, a jornada da minha neta que, desempregada, recorreu à cozinha para se sustentar durante a pandemia – abrir o próprio negócio, aliás, foi a saída encontrada por um grande número de pessoas que perderam seus trabalhos formais com o agravamento da crise da Covid-19, no ano passado. Ela ficou quase dois anos sem emprego fixo e mesmo com curso superior em administração e marketing – a primeira da família a concluir uma graduação – fez marmitas para entregar. Ela sabia que para conquistar o cliente precisaria investir não só em sabor, mas, também, em apresentar bem os pratos e escolher uma embalagem atrativa. Deu muito certo para ela, que investiu em um segmento que está muito em alta entre as empreendedoras, o de alimentação saudável.
A pandemia fez com que uma fatia razoável da população trabalhasse de casa e isso mudou a rotina de muitas famílias brasileiras, que para se alimentarem de forma saudável recorreram às marmitas balanceadas – com isso, além de ganharem saúde economizaram tempo.
O ramo alimentício foi o mais procurado pelos novos empreendedores, juntamente de outras áreas ligadas à criatividade, como costura e beleza. Aliás, muitas jovens que investiram em cursos de estética e se dedicam a fazer sobrancelha e unha nas casas dos clientes têm se dado muito bem, afinal, sempre há espaço (e dinheiro) para um tanto de vaidade.
Entendo que empreendedorismo tornou-se palavra-chave durante a pandemia e que usar a criatividade é a melhor estratégia para conseguir sucesso no campo escolhido e se destacar em um mercado que, de repente, acabou ficando muito concorrido. O exemplo da minha neta, que inovou com suas quentinhas, pode inspirar quem está começando agora.
A Danone, copatrocinadora do Prêmio Trip Transformadores, acaba de ser reconhecida como Empresa B. No campo da sustentabilidade, a marca tem iniciativas como o projeto Kiteiras, que desde 2011 incentiva o desenvolvimento e empoderamento de mulheres de comunidades menos favorecidas e que desejam empreender — homens também são bem-vindos no programa.