Educação e tecnologia

por Claudio Sassaki

Fica fácil perceber que a escola que se resume a transmitir conteúdo é uma escola insuficiente para os desafios das próximas décadas

Trabalhando com tecnologia educacional, não deve ser nenhuma surpresa que tenha escolhido para minhas filhas, Yasmin e Luana, uma escola com material didático primordialmente digital. O ambiente virtual é parte da rotina delas, ainda que tenham apenas 8 e 10 anos; está presente na comunicação, no entretenimento e, agora, também, no processo de aprendizagem – isso me entusiasma, mas também me preocupa como pai de duas pré-adolescentes que estão crescendo em um universo completamente diferente daquele que eu vivi na minha época de escola.

Quando eu estava no colégio, havia um leque de opções quanto a qual caminho seguir após a formatura: eu seria médico, advogado, engenheiro, professor…? Escolha feita, a trajetória era mais ou menos clara e linear: envolvia decorar o conteúdo, tirar boas notas, fazer simulados e entrar na universidade. Isso, com certeza, garantiria que eu conquistasse um bom emprego.

A realidade das minhas filhas é outra. Em primeiro lugar, porque estudos estimam que 85% das profissões que teremos em 2030 ainda não existem. Em segundo, porque cada vez mais o mercado de trabalho passa a exigir de seus profissionais competências como colaboração, pensamento crítico, comunicação e criatividade, em vez de saberes estáticos. E, por fim, porque elas próprias são parte de uma geração – a Geração Z, nascida a partir dos anos 2000, para quem tecnologias digitais não são nenhuma novidade – questionadora, empreendedora e com acesso à informação 24 horas por dia, sete dias por semana.

A escola da Geração Z

Fica fácil perceber que a escola que se resume a transmitir conteúdo é uma escola insuficiente para os desafios das próximas décadas. Não nos basta mais a antiga definição de "bons professores" como aqueles que melhor transmitiam um currículo fixo, imutável, ou de "bons alunos" como os que melhor aprendiam (ou memorizavam) esse tal currículo.

Reforcei essa hipótese há algumas semanas, quando participei do Project Zero, em Harvard, com o psicólogo e educador Howard Gardner, criador do conceito de inteligências múltiplas. Durante a imersão, discutimos o fato de o processo educativo muitas vezes não incentivar os alunos a pensarem; e como, sem pensar, não há aprendizado. Estou me referindo àquele aprendizado que permanece, do que me lembro semanas após uma prova, não àquele que eu apenas decorei para o dia do exame.

“É incrivelmente desafiador promover uma sala de aula pensante”

Soa óbvio demais? E é. Mas também é incrivelmente desafiador promover uma sala de aula pensante. Quando os alunos estão sentados copiando da lousa, eles não estão pensando. Pensar – em suas várias formas, como observar, analisar, questionar, inferir, relacionar etc. – requer ações estruturadas, com intencionalidade pedagógica, formação e recursos que permitam colocar o jovem em uma posição proativa no processo de aprendizagem.

Um exemplo disso surgiu da própria Yasmin, agora com 10 anos, enquanto fazia a tarefa de casa. Ela estava olhando longamente para uma gravura quando me disse: "Essa imagem me mostra isso, a partir dela, eu entendo isso e ela me faz querer saber mais sobre isso". Fiquei impressionado com a forma clara como ela expôs seu raciocínio, para depois descobrir que sua professora estava usando uma rotina de pensamento chamado See, Think, Wonder, algo como "Veja, pense e pondere", em português, também desenvolvido pelo grupo de pesquisadores do Project Zero. Na aula seguinte, ela e os colegas compartilharam suas impressões e se aprofundaram no tema sobre o qual já haviam refletido em casa.

A tecnologia é apenas uma parte de um projeto educacional maior

Portanto, essa mesma escola que está usando estratégias ativas de aprendizagem passa, agora, a apostar num material didático predominantemente digital. Por que isso faz sentido?

“Uma escola que busca promover a colaboração, a interação e autonomia de seus alunos vai necessariamente se inserir no universo digital”

Porque uma escola que busca promover a colaboração, a interação e autonomia de seus alunos vai necessariamente se inserir no universo digital – não como um modismo, mas porque entende que seus alunos já estão nesse universo. Como dizia Prensky, as gerações nascidas imersas em tecnologia digital desenvolveram formas diferentes de processar informações e de se comunicar, diferenças que moldam seus cérebros e se estendem também para suas vidas off-line.

O material digital faz sentido para a geração da Yasmin e a Luana, que assistem a youtubers tanto para entretenimento quanto para estudos; que recebem notícias atualizadas a cada segundo, com a possibilidade de compartilhar, comentar ou retratar suas emoções usando emojis. Porém, o uso da internet vai muito além da brincadeira: no ano passado, a pesquisa "O jovem brasileiro e o futuro do país" descobriu, após entrevistar 1.700 jovens, que mais de 60% deles já haviam se envolvido com alguma causa social via internet. Será correto, então, dizermos que esses jovens são desinteressados – ou apenas que a escola engessada, que se recusa a mudar, não é mais capaz de conquistar sua atenção?

As possibilidades são de brilhar os olhos! A começar por uma aprendizagem ativa, interativa e multimídia, combinando recursos que os preparem para o mundo real e respeitem seus múltiplos estilos de aprendizagem. Estão disponíveis assuntos contextualizados e atualizados constantemente, relacionando aquilo que se aprende diariamente ao mundo além das paredes da escola. Outro benefício afeta alunos, mas se estende a professores, gestores e pais: a geração de dados que permitem um olhar personalizado para a trajetória de cada estudante, favorecendo intervenções efetivas.

Com o material digital das minhas filhas, eu consigo participar de suas rotinas escolares – sei quando entregaram as tarefas de casa e quando estão com dificuldade em algum assunto; por consequência, sou capaz de ajudá-las sem ter que esperar por uma prova no final do semestre. O mesmo vale para os professores, que ganham um olhar personalizado para cada um em sua sala de aula e assim compreendem os diferentes ritmos de aprendizagem que precisam ser contemplados. Por mim, as próprias Yasmin e Luana têm resultados ágeis, criando uma sensação de corresponsabilidade: estamos todos, escola e família, comprometidos com o sucesso delas e equipados para apoiar esse desenvolvimento.

A questão não é mais se a escola deve ou não utilizar tecnologia, tampouco quando deverá utilizá-la – a transição já começou. Nosso desafio como país é assegurar que essa mudança ocorra de maneira mais eficaz e consciente.

Com grandes ferramentas, vêm grandes responsabilidades

Se o potencial da tecnologia educacional é tão animador, você pode estar se perguntando por que saber que minhas filhas estudariam com um material 100% digital me deixou ao mesmo tempo entusiasmado e receoso.

Ao longo dos seis anos em que empreendi na Geekie, pude extinguir qualquer dúvida de que a tecnologia representa novos horizontes para a educação de nossos filhos – isso se usada com responsabilidade. Ou melhor, corresponsabilidade. Com o mundo nas mãos, e ainda que pareçam não precisar de ajuda para apertar botões e deslizar telas, não podemos esperar que eles entendam a amplitude e, sobretudo, as consequências de suas ações on-line.

“De que forma a tecnologia me ajuda e me atrapalha? Tudo isso exige diálogo constante, tanto em casa quanto em sala de aula”

Junto com as ferramentas, é imprescindível que escola e família discutam quais os comportamentos adequados em cada ambiente. Com quais grupos posso dividir essa imagem? O que acontece com meu comentário depois de postado nas redes sociais? O que é cyberbullying e o que fazer caso presencie ou seja vítima de um caso como esse? Quem produz o conteúdo que eu estou lendo ou assistindo? Quanto tempo gasto com redes sociais e games, em relação a outras atividades? De que forma a tecnologia me ajuda e me atrapalha? Tudo isso exige diálogo constante, tanto em casa quanto em sala de aula.

Como pai, faço questão de que meus filhos participem desse debate, ouvindo suas vozes e entendendo como protegê-los, sem, contudo, privá-los da experiência de crescer em um mundo digital. Como CEO da Geekie, tento levar essa conversa para dentro de nossas escolas parceiras, transformando a cultura escolar não apenas por meio das plataformas que desenvolvemos, mas ajudando-as a se preparar para as demandas do século 21. E arrisco dizer que, nesse novo milênio, a educação digital será tão importante quanto inglês, história ou matemática – formando os profissionais e, acima de tudo, os cidadãos que queremos em 2030.

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