Quer ser uma drag queen? Pergunte-me como

Criador da drag Ikaro Kadoshi, Tiago Liberato fala sobre o preconceito que sofreu desde a infância, masculinidade, afeto e sua luta para entregar ao mundo o que nunca recebeu

por Redação em

Quem escuta o paulista Tiago Liberato falar com toda a doçura que traz na voz e nas palavras não pode imaginar tudo o que ele passou desde que assumiu a homossexualidade aos 13 anos – com resquícios de crueldade medieval, como define sua infância. Hoje, por meio da drag queen Ikaro Kadoshi, que criou no fim dos anos 1990, o artista apresenta no Prime Video o programa “Caravana das Drags”, ao lado de Xuxa Meneghel, e quer ser a inspiração que lhe faltou. “Estou rompendo um ciclo, devolvendo ao mundo o que ele não me deu. Gostaria de ter passado pelo que eu passei? Não. Mas já que passei, vou fazer o melhor disso”, diz. Tiago também foi a primeira drag queen a assinar um contrato com a Nike para ser embaixador da causa LGBTQIANP+ nos esportes.

No papo com o Trip FM, ele também falou sobre dinheiro, masculinidade e preconceito. “O Brasil é um país de ironia. Somos os que mais matam LGBTQIAPN+ no mundo, o país que mais consome pornografia de travestis e transexuais e também o que tem as drag queens mais famosas. Repressão é isso: ame e odeie ao mesmo tempo, na mesma intensidade”, afirma. Você pode ouvir essa conversa no play aqui em cima e também no Spotify.

íkaro Kadoshi, Drag Queen, apresentador de TV e jornalista - Crédito: Blad Meneghel / Divulgação

Trip. Você sofreu muito com a família do seu pai. Quanta importância teve a aceitação da sua mãe?

Tiago Liberato. Quando a minha mãe disse que eu não precisava mudar em nada o que sou, ganhei uma força para enfrentar o mundo. Ser LGBTQIAPN+ no Brasil é enfrentar a sociedade todos os dias, de uma maneira que as pessoas desconhecem. O amor de mãe me deu esse porto-seguro. Se vocês soubessem a importância de amar as pessoas como elas são... A gente só consegue chegar à nossa plenitude quando recebe esse tipo de amor. Hoje eu faço um esforço gigantesco para me amar, para não ser o meu pior inimigo. E faço um esforço tremendo para não devolver ao mundo o que ele me dá, que é raiva, ódio e humilhação. A dor é a melhor professora que a gente tem. Estou rompendo um ciclo, estou devolvendo ao mundo o que ele não me deu. Gostaria de ter passado pelo que eu passei? Não. Mas já que passei, vou fazer o melhor disso. 

Por que você conta que ser drag é se assumir duas vezes? Porque muda toda a estrutura à sua volta. Eu perdi todos os meus amigos e tive que começar do zero. O que me dá orgulho é que a nova geração vive em um mundo diferente. Hoje as drags são casadas, têm namorado, são orgulhosas de si e seguram as rédeas de suas vidas. Antes era uma morte social. Eu ouvi muito: "Se for pra namorar você eu namoro uma mulher". Até hoje ainda não consegui andar de mão dada com alguém na rua – me gera um gatilho de que vou ser morto. Quando me tiram o direito de exercer o afeto, me transformam em um bicho. E as consequências disso são culpa de quem? Falam: "Eles são agressivos, são reativos". Experimenta tirar todo o afeto que você pode ter, tirar os espaços...

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Imagem principal: Blad Meneghel / Divulgação

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