Moradora de rua, prostituta, internada como louca e pintora, ela retratou as várias faces da violência contra a mulher
Aurora Cursino nasceu em São José dos Campos, no interior de São Paulo, e começou a frequentar aulas de pintura ainda na juventude
Depois de um casamento mal sucedido, foi morar na rua e trabalhar como prostituta, até ser internada pela primeira vez em um hospital psiquiátrico paulistano
Com o diagnóstico de “personalidade psicopática amoral”, foi transferida para o Complexo Psiquiátrico do Juquery, em Franco da Rocha (SP), em 1944
De dentro do hospital psiquiátrico, ela pintou mais de 200 quadros que retratam a condição da mulher de sua época
Na instituição, frequentou os ateliês da Escola Livre de Artes Plásticas (Elap) e passou a integrar exposições pelo Brasil
Isso foi possível graças ao trabalho de psiquiatras como Nise da Silveira (1905-1999), que lutou pelo tratamento humanizado de pacientes com transtornos mentais
Ainda que violência manicomial já fosse debatida na época, ela sofreu uma lobotomização pouco antes de morrer
Esse tipo de cirurgia no cérebro foi proibido em 1956 por deixar sequelas devastadoras ou levar à morte
A vida da artista virou tema do livro 'Aurora – Memórias e Delírios de uma Mulher da Vida', escrito pela historiadora Silvana Jeha e o psicanalista Joel Birman
“A vida que Aurora Cursino pinta aponta para uma série de violências que as mulheres sofreram no século 20, mas ainda sofrem no 21”, diz Silvana Jeha
“São abusos contra o corpo da mulher e da menina. É sobre aborto, gestação e parto. Sobre asilamento psiquiátrico de mulheres rebeldes”
“Parecia que ela pintava e escrevia sobre o que a fez enlouquecer. Para mim, ela desenhou, literalmente, o que é o patriarcado”, completa a autora