A advogada Patricia Marxs trabalha para desmistificar a laqueadura e torná-la mais viável para as mulheres que não querem ter filhos
O DIREITO À NÃO MATERNIDADE
Patrícia Marxs se sentia muito incomodada ao ouvir, quando mais jovem, que seria uma ótima mãe: “Não bastava dizer que me achavam inteligente e responsável, tinham que atrelar com a maternidade”
Aos 18 anos, a cearense conheceu seu ex-marido e se casou. De forma abusiva, ele a pressionava para ter filhos, o que deixou Patrícia paranoica com a ideia de engravidar
“Uma ginecologista, vendo que eu estava desenvolvendo um transtorno, perguntou por que eu não fazia uma laqueadura”, conta. “Na hora eu comecei a chorar. Era exatamente o que eu queria”
A laqueadura é um procedimento simples, que promove a obstrução das tubas uterinas ou amarra suas extremidades, impedindo que os óvulos entrem em contato com os espermatozóides
Segundo a lei, qualquer mulher com mais de 25 anos ou que tenha dois filhos pode realizar uma laqueadura. Seja gratuitamente, pelo SUS, ou na rede privada. Mas o procedimento precisa ser autorizado
É preciso registrar a intenção e esperar 60 dias para conversar com especialistas, que analisam se a mulher tem condições de tomar essa decisão. As casadas ainda precisam da permissão do cônjuge
“A burocracia e o tabu em torno do procedimento acaba afastando-o das mulheres”, diz Patrícia, que criou um perfil no Instagram para apoiá-las
No projeto, a advogada, que passou por uma salpingectomia – procedimento um pouco diferente da laqueadura, que retira as tubas uterinas –, também oferece orientações jurídicas sobre o assunto
“Muitas mulheres relatam que tiveram seu direito à laqueadura negado. Não porque não cumpriam os critérios, mas porque o profissional simplesmente se negou a fazer”
Para ela, esse comportamento se classifica como uma violência, e muitas vezes não é tratado como tal. “Você está impedindo uma pessoa de exercer seu direito reprodutivo”, explica
Apesar da dificuldade estar presente tanto no SUS quanto na rede privada, Patrícia reforça que a experiência muda dependendo da condição social. “O Estado sempre quis decidir quem pode ter filho”
“A lei de que a laqueadura não pode ser feita durante uma cesária foi criada por conta de casos em que mulheres pobres e com vários filhos foram esterilizadas de forma compulsória”, lembra
A experiência das mulheres que desejam a laqueadura também é muito diferente dos homens que desejam fazer uma vasectomia, tanto no campo técnico como no pessoal
“Quando digo que não quero ter filhos, as pessoas falam que filho é prova de amor ou que vou ficar sozinha quando envelhecer. Quando meu marido diz a mesma coisa, as pessoas elogiam a independência”
Apesar do tabu, cada vez mais mulheres procuram Patrícia para se informar sobre a laqueadura. “Existe um movimento de conscientização de que não ser mãe é uma escolha válida”, diz