POR: camille mello

A tendência chamada “female
rage” inspirou na literatura,
no cinema e na música obras em
que mulheres expressam a raiva
de uma vida inteira de violências
suportadas em silêncio

Como a fúria
feminina
se tornou
movimento
artístico

Ao longo da história, desde pelo
menos o século 16, mulheres
artistas manifestaram a raiva
que sentiam como forma de reagir
à opressão de gênero. Entre 1960
e 1980, os movimentos feministas
impulsionaram esse fenômeno
destacando a expressão da fúria
como arma na luta contra
o patriarcado
Por volta de 2018, o movimento
#MeToo encorajou milhões de mulheres
ao redor do mundo a falarem sobre
vivências de assédio e abuso sexual.
Segundo a pesquisadora Sigrid
Wallaert, da Universidade de Gante,
na Bélgica, foi aí que surgiu
uma nova onda de raiva feminina,
inspirando a produção acadêmica
e artística mais recente
A escritora best-seller Soraya
Chemaly define a fúria feminina
como um ato político. “A raiva
é um sentimento que as mulheres
aprenderam a manter em segredo.
Enquanto, nos homens, ela
é associada a poder, nas mulheres,
esse sentimento é invalidado.
É hora das mulheres usarem
a fúria como combustível
e forma de empoderamento”
Na literatura, Virginia Woolf
é apontada como a grande expoente
do female rage do século 20 e,
no livro “Um Quarto Só Seu”
(1929), a autora mapeia a raiva
na escrita de outras mulheres
Essa forma de expressão continua
viva nos romances da italiana Elena
Ferrante e também pode ser sentida
no livro “Com todo o meu rancor”
(2022), da brasileira Bruna Maia.
No campo da não ficção, figuram
publicações como a autobiografia
da ativista Brittney Cooper,
“Eloquent Rage: A Black Feminist
Discovers Her Superpower” (2018)
As mulheres também estão
chegando com o pé na porta
no cinema. Carrie (1976)
é uma adaptação da literatura
que fez um grande sucesso
nas telonas e abriu a pauta
para que filmes como Kill Bill
(2003), Garota Infernal (2009),
Garota Exemplar (2014)
e Bela Vingança (2020)
pudessem brilhar
As séries Fleabag (2016),
The Handmaid’s Tale (2017),
Killing Eve (2018), I May Destroy
You (2020) e Pequenos Incêndios
por Toda Parte (2020) retratam
mulheres que não têm o menor pudor
de demonstrar agressividade
Na música, artistas pop
têm atualizado a atitude furiosa
de bandas femininas de rock
e punk dos anos 1970 e 1980,
provocando catarse no público
Os clipes de “Hold Up”,
em que Beyoncé quebra
carros com um taco
de beisebol, e o de
“Wrecking Ball”, em que
Miley Cyrus destrói
tudo com uma bola
de demolição, são bons
exemplos da sensação
libertadora que a raiva
pode trazer em reação
a traições ou racismo
e sexismo sistêmicos

é outra
conversa.