POR: carol ito
fotos: arquivo pessoal A psicóloga indígena
Geni Núñez traça paralelos
com a floresta para falar
sobre não-monogamia nas
redes sociais numa
perspectiva descolonial
A monocultura
dos afetos
Geni Núñez, indígena do povo
Guarani, vive em uma comunidade
em Santa Catarina e é psicóloga
e doutoranda em ciências humanas,
com pesquisas sobre gênero,
raça e decolonialidade
Há alguns anos, ela decidiu
usar as redes sociais para
compartilhar suas reflexões
– e soma mais de 100 mil
seguidores em seu perfil no
Instagram, o @genipapos
“Iniciei o debate sobre
não-monogamia há 10 anos.
Busco pensar outras
práticas de cuidado, de
relação, de vínculo, para
além da matriz européia,
cristã e colonial”, conta
Os debates lançados por
Geni costumam fazer um
paralelo entre a forma como
nos relacionamos com outras
pessoas e com a natureza
“Eu vinha percebendo que
a monocultura não era
só da terra, mas também
do pensamento, levando
ao que eu chamo de
monocultura dos afetos”
“A monocultura é um
sistema que não admite a
concomitância. Um campo
de monocultura não
admite floresta, é preciso
derrubá-la para existir”
“No campo das relações
monogâmicas, a gente
aprende que para alguém
provar que nos ama,
precisa não amar
outras pessoas”
“É uma forma de criar
vínculo em que o que
conta não é exatamente
o que acontece na
relação, mas o que não
acontece em outras”
Pensando em relações amorosas
menos excludentes, que não
sejam baseadas na ideia de
traição e posse, ela traça
um paralelo com a floresta
“Para nós, indígenas, essa
ideia de que um humano
se acha dono do rio,
dono de outra vida, é
completamente distante
da nossa forma de
nos relacionar com
os outros seres”
“Se a gente não acha que um
rio é nossa propriedade,
nossa posse, tampouco uma
pessoa seria. A floresta,
para ser diversa, precisa
estar em concomitância
com outras existências”
Entre as inspirações de Geni,
estão os textos do intelectual
martinicano Frantz Fanon e da
escritora e ativista espanhola
Brigitte Vasallo
A psicóloga também oferece
formações on-line sobre os
temas que pesquisa. Parte
do dinheiro é destinada às
comunidades indígenas Guarani
“É uma forma que encontrei
de compartilhar não só
o que eu estudo, como
também o dinheiro que
precisamos para ir para
atos em Brasília, comprar
alimentos e roupas”