por Fabiano Alcântara

Paulistano defende colaboração criativa e novo modelo de músico: ”Todo mundo é importante”

Quem procura um novo Criolo, Céu ou Curumin na fértil cena paulistana certamente não encontrará. Cada artista tem sua história e organiza suas referências musicais de forma única. No entanto, há boas novas surgindo no campo da MPB para os lados do Bixiga. Dezenas de artistas vêm se organizando de maneira colaborativa para produzir uma música popular múltipla, entre a canção e o experimental. "Todo mundo é importante", defende Pipo Pegoraro, na contramão do culto à personalidade.

Guitarrista, cantor e produtor convertido em artista solo, Pipo lançou seu segundo álbum Taxi Imã (YB) no ano passado e vem se apresentando ao vivo com repertório baseado no disco. Eleito pela MTV e pelo UOL como um dos 10 melhores álbuns de 2011, o disco tem recebido excelentes resenhas e críticas da imprensa especializada.

A geografia musical de Pipo parte de São Paulo, Bahia, Nigéria, guiada por Itamar Assumpção, Gilberto Gil e Fela Kuti, e chega a lugares imaginários. "É como se dentro de um sonho, Pipo fosse um taxista mágico que nos leva para uma espécie de viagem ao mundo em aproximadamente 50 minutos", define o coprodutor do disco, Bruno Morais. Outros nomes da nova cena como Kiko Dinucci, Luisa Maita, Blubell e Silvia Tape participaram do álbum e são parceiros dos palcos.

Taxi Imã teve mais de 30 colaboradores. Os ensaios para criação e gravação do disco resultaram na formação do Bixiga 70, grupo que ajudou a impulsionar uma febre em São Paulo em torno do afrobeat. O gênero musical criado pelo nigeriano Fela Kuti - que mais tarde abdicou do termo para adotar a terminologia música clássica africana – vem sendo redescoberto pelas novas gerações, assim como os ideais da comuna Kalakuta encontram ecos entre os que defendem uma vida comunitária e nos artistas politicamente engajados.

Novo modelo de músico - que precisa ser operário, empresário, pensador, produtor e administrador – Pipo mostra-se aberto às parcerias e conexões. “O que possibilita ter uma carreira hoje são os elos sólidos com as pessoas que estão ao nosso redor, incluindo músicos, produtores culturais, assessores e uma cadeia enorme de pessoas que proporciona caminhos possíveis para o artista se movimentar”, defende.

Se pudesse escolher uma banda com músicos de todos os tempos, quem chamaria?
Pipo Pegoraro - Pode soar meio piegas ou meio puxando a sardinha para “os meus”, mas sinto que gosto de tocar com quem estou tocando atualmente - Décio 7 (bateria); Guilherme Kastrup (percussão); Marcelo Dworecki (baixo); Cuca Ferreira (saxofone e flauta); Fernando TRZ (piano); Didi do Trombone (trombone) e Lucas Cirillo (gaita) - compartilhando sonoridades, sentindo as pessoas e a maneira como a música acontece através do presente em que vivemos.

Nada fácil escolher uma banda de todos os tempos, creio que faria algo assim: (esse é primeiro pensamento, acho que seria uma lista interminável), optei por fazer uma banda com medalhões, mas teria muita gente atual pra chamar: Steve Reich e Edvard Grieg (orquestração, arranjos); Bob Marley/Bob McFerrin/Cesária Évora (vozes); Mulatu Astake (piano); Hermeto Pascoal (qualquer instrumento), Sly & Robbie (cozinha – baixo e bateria); Gilberto Gil (violão); Richard Galliano (bandoneon), Coltrane (sax), Miles (trompete).

Você se sente parte de uma cena? Quem você acha relevante na música hoje?
Acredito que há uma cena em expansão. Circuitos sendo mapeados, muitos artistas incluindo suas obras em festivais fora do contexto das cenas regionais e várias bandas indo tocar em outros países. Não sei se podemos nomenclaturar como nova cena já que essa movimentação já ocorre faz tempo, mas que há uma efervescência musical se liquidificando e se transformando, sem dúvida! 

Há uma leva de artistas interessados em criar e levar sua obra de maneira honesta para seu público. Hoje em dia o artista músico acaba “ofertando” sua arte (disponibilizando álbuns/shows) e gerando feedbacks para sobreviver de vários outras maneiras, além dos shows... Sem julgamentos, cada um entende a sua obra do jeito que acha conveniente e possível. Todo mundo é importante.

Fale um pouco sobre o que o atrai em Itamar, Gil e Fela, mentores do Taxi Imã...
Sempre escutei demais Gilberto Gil e Itamar Assumpção desde pequeno. Lembro de minha irmã comprando discos (vinis) deles e quando chegava em casa era um momento faiscante, ficávamos ouvindo durante dias o mesmo disco! Além da referência carinhosa que tenho por esses dois artistas, acho a obra e a maneira como constroem suas ideias fantásticas. 

Fela Kuti é um artista que descobri em minha adolescência, tem menos sabor de infância, mas quando ele chegou em minha vida tive a sensação de escutar algo extremamente forte e original. Sentindo a obra desses três artistas tenho impressão que possuem matrizes rítmicas, poéticas, melódicas que de alguma forma se esbarram e me inspiraram a compor o "Taxi Imã".

Qual é o segredo pra conseguir ter uma carreira hoje, com gravadoras enfraquecidas e tudo meio disperso e gratuito na internet?
O que possibilita ter uma carreira hoje são os elos sólidos com as pessoas que estão ao nosso redor, incluindo músicos, produtores culturais, assessores e uma cadeia enorme de pessoas que proporciona caminhos possíveis para o artista se movimentar. Hoje em dia é tranquilo fazer suas músicas e gravá-las dentro de um quarto, colocá-las num site e compartilhar suas ideias, mas para dar um próximo passo além da porta de casa, impreterivelmente o artista terá que ter conexões com pessoas não virtuais. 

Myspace, Facebook, Soundcloud, Reverbnation são ferramentas de divulgação que ajudam a apresentar seu trabalho, mas esses portais também jogam a obra num oceano de possibilidades.

Como sair disto, então?
Acredito que ter consciência da mudança do “esquema gravadora” e sacar que como artista você tem que entender essas diversas “posições de atuação no campo musical” em prol da consistência de sua obra. Isso muda e orienta a forma de pensar a criação, distribuição e mesmo a captação de recursos para viabilizar um trabalho artístico. 

Nesse contexto sem gravadora e tal, cresceram os editais que às vezes privilegiam mais uns que outros, mas isso dá uma outra questão enorme...

Se puder definir, qual é sua missão na música?
Transformar!

Vai lá: Pipo Pegoraro no SESC Ipiranga
Quando: Sexta, 6 de julho, às 21h
Onde: Teatro do Sesc Ipiranga - R. Bom Pastor, 822 – São Paulo/SP - (11) 3340-2000
Quanto: De R$ 4 a R$ 16 (capacidade – 200 lugares)
www.pipopegoraro.com
Disco para download gratuito aqui.

 

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