Quem se vê na TV?

por Marcos Candido

Três apresentadores. Um gay, uma lésbica e uma trans. Eles são estrelas de um novo programa de televisão criado para discutir com diversidade na TV aberta

Ellen Oléria, Fefito e Mel Gonçalves. Um lado ao lado do outro, sentados em poltronas coloridas, sob as luzes do estúdio. Respectivamente, uma lésbica, um gay e uma transexual. O trio se reúne às terças-feiras, passam pela maquiagem e entram em estúdio para a gravação do Estação Plural, programa exibido em TV aberta para todo o Brasil.

Com uma hora de duração, a atração recebe um convidado especial, discute pautas sobre comportamento, inclusão, música e assuntos ligados ao universo LGBT. "Nada como um texto em primeira pessoa", diz a cantora Ellen Oléria.

Até chegarem ao formato ideal, apresentadores e produção chegaram a um consenso. "Não queremos encaixotar ninguém, mas debater com diversidade", diz Fernando Oliveira, nome de batismo de Fefito, jornalista e ex-comentarista do Mulheres, programa veiculado desde os anos 80 pela TV Gazeta. 

"Não gosto de dizer que estamos 'ensinando' alguma coisa, mas as pessoas aprendem com nossa vivência", explica Mel Gonçalves, integrante da Banda Uó e primeira trans a estrelar uma campanha de cosméticos no Brasil.

"Acho que o público aprendeu a olhar de uma forma muito pejorativa para si mesmo. Nossa intenção é desenhar novos rumos para esses olhares", pontua Oléria, vencedora da primeira edição do The Voice Brasil, em 2012. 

De formas diferentes, os três apresentadores já foram parte da programação televisiva. Agora, como protagonistas, abriram mão do papel messiânico para mostrar que são pessoas comuns. "Eu caso, eu separo e como miojo de madrugada como qualquer pessoa", diz Fefito. Porém, também sabem que pessoas convencionais, como eles, ainda faltam no televisor. 

Quem se vê na TV? "Até pouco tempo, menos pessoas do que hoje. Antes, quem se via na televisão eram pessoas brancas, de cabelo liso, classe média, com empregadas domésticas que moravam no Leblon. Hoje, existem mais pessoas reais ", pondera Mel Gonçalves. 

Quem são essas 'pessoas reais'? "Na maioria, são pessoas simples, como a mulher negra que sempre aparecia em papeis subalternos, e agora é retratada de forma diferente. O homem homossexual, principalmente nas últimas novelas da Globo, está menos estereotipado. E isso não se aplica só ao público ao LGBT, mas à beleza natural. Ainda falta muito, mas é um início", diz Mel Gonçalves. 

 A TV pode mudar as pessoas? "Eu acho que as pessoas têm o poder de mudar a TV. Esse aparelho que, a priori, mantém uma relação de passividade, pode ser mudado pelo poder que existe na mão e no controle remoto de quem o vê", explica Ellen Oléria.

Mas há quem se vê nessa programação? "É uma boa pergunta. O público brasileiro ama televisão, mas esse meio fala de uma cultura imediata, deixando de lado essa marca do capitalismo, que é o excesso em contraste com a escassez. O jornalismo é sensacionalista, o que faz o povo acostumar a se olhar de forma pejorativa ao ter que lidar com tantas informações densas", diz Oléria.

A televisão padroniza pessoas? "Claro que padroniza. A gente vê galãs negros? Quando Lázaro Ramos tentou fazer um galã negro, ele foi altamente criticado. Também não existem galãs assumidamente gays", explica Fefito.

Então, a TV muda o público? "A TV pode ajudar. Uma vez, estava numa balada, e um moço me abraçou no banheiro. Fiquei meio emocionado, não sei se foi pelo álcool [risos], mas fiquei bastante comovido. Ele medisse que a mãe dele passou a aceita-lo depois que começou a me assistir Mulheres. Ela viu que ser gay não era uma promiscuidade, e muitas das mulheres que assistiam o programa me adotariam como neto. Eu não mudei ninguém, mas uma janela foi aberta para se pensar", diz Fefito.

Vai lá: Estação Plural
Quando: Sexta, às 23h, com reprises na Segunda, à meia-noite
Onde: TV Brasil

fechar