por Milly Lacombe
Trip #220

A Trip Girl que quer mudar o mundo se entrega de corpo e alma às lentes da Trip

Você vê curvas perfeitas, ela vê injustiça. Você vê libido, ela vê a necessidade de se entregar à luta. Laura Diaz, a proprietária de linhas tão bem integradas, quer mudar o mundo. Mas, por hoje, pode ser só o seu

A menina da página ao lado, essa que faz com que sua circulação ganhe ritmo, está sendo processada por formação de quadrilha. Laura Diaz era uma das 72 pessoas que estavam no prédio da reitoria da Universidade de São Paulo na noite de 8 de novembro de 2011, quando a polícia militar entrou e prendeu os manifestantes, que gritavam por uma universidade “despoliciada”: para os envolvidos, não se pode pensar livremente com policiais fazendo rondas e checagens. Por isso, a fim de tentar desencaretar um campus, aos olhos deles cada vez mais decadente, resolveram agir, algo que Laura faz muitas vezes por ano, em nome de causas que considera significativas. Às vezes, vestida; outras, despida.

Em dez minutos de conversa fica evidente que ela é feita de um material poderoso, a indignação. Não há, aliás, outro caminho para mudar o mundo; só os indignados fazem a roda girar. No caso dela, a combinação é inflamável: rosto e corpo perfeitos e intensidade suficiente para alterar as marés. Talvez tenha sido justamente movida por altíssimas doses de indignação que ela tirou a roupa em público pela primeira vez. “Nem me lembro quando foi”, diz. Ela só lembra que aconteceu do jeito mais natural possível. “Não tenho problema em me despir e usar meu corpo. Só acho que temos que tomar cuidado em como usar o corpo porque, com ele, estamos comunicando uma mensagem.”

Amor Livre

Laura tem 23 anos, está se formando na Escola de Comunicação e Artes da USP e trabalha na TV USP. Para quem quiser escutar o tom encantadoramente indignado de sua voz basta tocar em assuntos como Pinheirinho, homofobia, corrupção, política nacional e cerceamento de liberdades. “O que me move é a escalada da repressão pelo país e pelo mundo. Que democracia é essa?” Quero saber como tirar a roupa pode ajudar na causa, e ela diz: “Tirar a roupa ou ficar com ela não tem nada a ver com a luta, do ponto de vista estrutural. Quando a gente coloca o corpo dessa maneira a gente se opõe à violência da vida, ainda mais numa cidade como São Paulo”. Estar despida, eu concluo, é um apelo natural pela liberdade que nos é, todos os dias, roubada em nome dessa falsa segurança que se chama repressão. “O absurdo não é eu estar despida no centro de São Paulo, o absurdo é a violência, é o que viraram as relações amorosas, meramente contratuais e econômicas, é a gente ser estuprado no trabalho todos os dias e achar que está OK aquele salário que não está nada de acordo com o tanto que se trabalha.” Mesmo se ela estivesse falando a favor da absurda escolha de Marco Feliciano para a Comissão de Direitos Humanos da Câmara seria muito difícil discordar; é um poder que vem de fábrica com toda mulher muito bonita.

Recentemente, saiu da casa dos pais no bairro de Santa Cecília e foi morar com três amigas. Marxista, diz que o essencial em qualquer linha política é a capacidade de agir. “Se você não aplica as coisas que você idealiza, vai ficar paralisado e virar aquele tipo de cara que só reclama. Velhos de 20 anos. Eu conheço muitos, gente que está aí parado criando raízes.” As críticas se estendem aos relacionamentos – precisamente, aos “2 mil anos de história que construíram casamentinhos meia bomba e relaçõezinhas levianas”, como ela diz. “É claro que não é fácil mudar o esquema para uma forma de amor mais livre, superar a discussão sobre ser hétero, homo ou pan. A revolução é permanente.” Pergunto se ela seria capaz de se apaixonar por alguém menos envolvido, e ela é rápida: “Acho que não tem como se apaixonar por alguém que está morto”.

Nas horas vagas, Laura toca com sua banda Angela Carne e Osso e os Bacanais – e, no caso, Angela Carne e Osso, “a mulher de todos”, é ela. Além disso, dedica-se ao trabalho que ama: montagem de filmes. Antes de encerrarmos, manda um último recado: “É hora de agir, de construir. É isso ou ficar para sempre reclamando como adolescente, e eu não quero acreditar que minha geração tenha tão pouco a dizer”. À luta, rapazes.

Vai lá: www.facebook.com/carneossoeosbacanais

Créditos

Coordenação Geral: Adriana Verani / Produção: Bernardo da Mata e Flavia Fraccaroli / Estilo: Aline Prado e Paulo Troya_Image S.H.E.E / Make&Hair: Paulo Ávila / Assistentes de Foto: Cal Vasques e Cadu Maya / Créditos de Moda: Agatha_American Apparel_Aparecida_B. Luxo Vintage_Converse_Darling_Levi’s_Scala / Tratamento de Imagens: Image Touch

fechar