por Luiz Alberto Mendes

Filme sobre Mandela inspira o perdão, a união e o cuidado com as outras pessoas

Assisti novamente o filme Invictus, que narra a vida do presidente Mandela depois que sai da prisão e a vitória do time de rugby da África do Sul no campeonato de 1995. É o primeiro passo para unir o país africano, dividido racial e economicamente, ao fim do apartheid. O que mais me impressionou e fez com que assistisse ao filme novamente foi o cuidado que o comandante da nação tinha com as outras pessoas.

Mandela estava convencido que o país poderia unir seu povo por intermédio da linguagem universal do esporte. Para tanto, chama o capitão da equipe nacional de rugby, François Pienaar, para conversar. O detalhismo e o interesse que o Presidente trata o pessoal que lhe serve mais diretamente, já começa a impressionar o rapaz. O capitão está nervoso antes de adentrar à sala presidencial, não sabe o que o espera e não tem idéia de quem seja o comandante da nação. Ao perguntar ao segurança que o encaminha à sala, branco como ele, sobre o que acha de Mandela, esse lhe responde que antes, em sua função, ele não poderia chamar a atenção sobre si de modo algum. Agora, cita um exemplo da transformação de seu cargo. O Presidente, ao saber que ele gostava de caramelo inglês, ao voltar de viagem à Inglaterra, trouxera caramelos para ele. E explica que, para o atual Presidente, ninguém é invisível.

Uma senhora adentra a sala com a bandeja de chá e Mandiba (seu apelido tribal) a trata com extremo cuidado, dispensando-a de servir o chá, servindo ele mesmo a seu convidado. É uma série de gestos, gentilezas, nele naturais, que convencem o capitão de estar na presença de alguém realmente raro e muito interessante.

E a gente, que esta assistindo, percebe que isso faz parte de uma autoeducação muito fina e cheia de pequenos detalhes, próprio de alguém que havia se preparado para aquela função de comandar o país. Parece mais pai daquela nação do que presidente. Conta ao capitão que na prisão, quando tudo ia mal, ele encontrava inspiração em um poema. Que tudo o que desejava fazer era o melhor de si e esperar o melhor de si na função que exercia. Disse que necessitava de uma forte inspiração para responder a todas suas expectativas acerca de si mesmo. O poema do qual falara lhe trazia exatamente aquela inspiração. O jovem comandante da equipe de rugby devia encontrar o seu poema para se inspirar a vencer a Copa do Mundo. Nas mãos dele estava a possibilidade de unir aquele país e fazer de, brancos e pretos, pobres e ricos, cidadãos da nação Sulafricana. 

Há um momento que me impressionou muito. Quando o jovem líder da equipe reflete que aquele homem, depois de 27 anos em uma cela, sai de lá para perdoar a todos que o sacrificaram quase a vida toda e conduzir o país à liberdade e ao entendimento. A mim, que fiquei 31 anos e 10 meses preso por motivos nada nobres em comparação aos objetivos de Mandela, é extremamente tocante. 

Mas tenho algo em comum a ele: de coração perdôo a todos que me sacrificaram, torturam e espancaram, a começar por meu pai. E, como ele, quero viver em paz com todos. Dentro de mim fica ainda o anseio, o desejo profundo de a todos compreender, importar-me com todos os outros seres humanos e dizer que podem contar comigo para todas as causas que forem dignas e edificantes. 

Claro, sou humano, limitado, cheio de erros e falhas, mas quero ainda um dia dizer o poema de Mandela com a convicção de como ele o diz:

"Agradeço aos deuses que possam existir
Pela minha alma inconquistável
Por ser eu o dono de meu destino
E capitão de minha alma..."

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