por Luiz Alberto Mendes

 

Durante muitos anos vivi com a idéia que amigos eram somente aqueles que encontrei na prisão. O que alimentava essa convicção era o compromisso que havia em uma amizade lá dentro. Caso alguém viesse atacá-lo por trás, amigo era aquele que defenderia suas costas. Os ataques, em geral, eram feitos pelas costas mesmo. E não era uma questão de covardia e sim de prática. Havia o chamado "choque" de guardas na prisão. Ao menor sinal de alerta eles corriam para o local da ocorrência com canos de ferros nas mãos para decidir. Chegavam com a violência total, apavorando. Eram sempre os mais violentos e mais fortes entre os guardas. Salvaram a vida de muitos presos que estavam sendo executados. Caso o agressor demorasse, não conseguiria seu intento de matar o inimigo. Se o "choque" chegasse a tempo, teria que entregar a faca e a vítima seria socorrida imediatamente. O que seria extremamente complicado porque ele sabia que estava "criando cobra" para picá-lo no futuro. Estava claro que seria pago na mesma moeda. As rinchas e os desafetos duravam anos, décadas às vezes, mas nunca eram perdoados. 

Em qualquer tipo de agressão, o amigo devia lutar a seu lado nem que para se expusesse ao perigo de ser morto junto contigo. Sempre que se criava qualquer impasse com algum outros preso, era preciso saber quem eram seus amigos. Porque dai para a frente eles podiam ser seus inimigos. Os assassinatos eram produto de conspirações; era preciso estar sempre atentos. O clima era de guerra e não dava para relaxar, cadeia era uma sucursal do inferno. Dai a importância do amigo e de saber selecionar. A fama, a honra e a moral precediam o homem aprisionado. As minhas amizades foram espontâneas e, por sorte, as melhores possíveis. Evitaram concretamente que eu fosse morto inapelavelmente. Tentei retribuir e sempre procurei estar junto na hora do perigo.

Aqui fora as amizades são líquidas, como diz Zigmund Bauman. No Facebook tenho quase 3 mil amigos, mas cada qual trata de sua vida. Não vivemos perigos eminentes. Mas continuo fazendo grandes amigos com os quais posso sempre contar. Não são muitos. Mas prefiro ter esses poucos do que todo dinheiro ou todas as posses. Percebo que dinheiro acaba e as posses podem ser diluídas. Muitos já perderam tudo o que tinham, exemplos existem aos montões.

Não é segredo que a minha situação econômica é, no mínimo, complicada. Além do preconceito pelo meu passado, um escritor neste país, embora tenha 5 livros publicados em editora renomada (Cia. das Letras), coluna na Revista Trip há 13 anos; blog com cerca de 5 mil acessos em uma semana; página no facebook que montei recente e posto textos todos os dias; faço palestras e Oficinas de Leitura e Escrita há mais de 10 anos; presto assessorias diversas e disposto a fazer tudo o que apareça, não é devidamente recompensado. Constantemente estou em crise financeira: tenho filhos a sustentar e uma vida a se fazer. Quando a situação aperta e não vejo saídas, procuro meus amigos. Eles sempre estão a postos. Tiram da cartola alguma atividade remunerada que eu possa fazer e logo me reequilibro. Eles são a garantia de que tudo sempre vai dar certo. Confio mais neles do que em qualquer outra coisa. O bom disso tudo é que eles confiam em mim também. Sabem que me esforçarei ao máximo.

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Luiz Mendes

20/07/2015.

Dia do amigo.     

  

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