Primeiramente, a cidade é nossa!

por Alê Youssef
Trip #262

O carnaval de rua de São Paulo está em risco?

Na bandeira da cidade de São Paulo está escrito em latim Non dvcor, dvco. “Não sou conduzido, conduzo.” Inspirados no lema, os membros do Bloco Acadêmicos do Baixo Augusta decidiram fazer uma brincadeira e criaram uma arte onde se lê “Não me apavoram, apavoro”. Há quase dez anos, o apavoro do Baixo Augusta ecoa como um grito de liberdade e de irreverência em meio à essa verdadeira guerra fria que se estabeleceu pelo direito de ocupar a rua, de brincar o Carnaval, de entender a cidade para as pessoas.

Em 2017, nosso grito de Carnaval – já marcado e calejado por sua veia ativista – ganhou ares ainda mais sérios pela ameaça que nossa festa sofreu de grupos de interesse que só pensam em ganhar dinheiro e se aproveitar da cidade. A transição no governo municipal abriu um período de incertezas e indefinições naturais, e com isso surgiu o espaço para que os articuladores dos subterrâneos da política agissem. Enquanto o prefeito Doria discutia com o ex-prefeito Haddad a passagem de bastão, vereadores tentaram aprovar uma legislação que na prática privatizava o Carnaval de rua de São Paulo. Fizeram isso no fim de dezembro, no apagar das luzes de um governo, sem debater o assunto ou falar com bloco algum.

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Festa livre

Com a união entre as pessoas que realizaram a retomada do Carnaval de rua da cidade nos últimos anos, compreensão por parte da maioria dos órgãos de imprensa sobre a manobra que acontecia na Câmara e amplo apoio da sociedade, barramos a iniciativa na Câmara Municipal e, com isso, partiremos para mais um ano seguindo o modelo de festa livre, democrática e descentralizada que o povo de São Paulo consagrou. O próximo passo, já prometido pelo novo Secretário de Cultura, é buscar, com diálogo e envolvimento de quem faz a folia, uma legislação que garanta a permanência do atual modelo e proteja nossa festa de ataques interesseiros. Enquanto isso, ficaremos atentos a manobras que possam trazer de volta a ameaça da privatização. Carnaval não pode ter dono nem patrão.

O Carnaval de rua de São Paulo não é obra de um partido ou de um político. É, na verdade, uma conquista da sociedade civil, que durante anos se mobilizou para chegarmos aonde estamos agora. Entre a época em que meia dúzia de amigos loucos e transgressores ocupavam a Augusta na marra entre carros e ônibus e hoje em dia, quando mais de 200 mil pessoas lotam a rua da Consolação celebrando o direito à cidade, muita coisa aconteceu.  Por isso, de uma maneira provocante, o tema do Carnaval Baixo Augusta 2017 virá pixado sobre o pavilhão da nossa cidade, para lembrar que não vão nos apavorar e a gente vai continuar se apropriando de São Paulo para transformá-la: primeiramente, a cidade é nossa!

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