A Família Ultrapassada

por Luiz Alberto Mendes

 

Às vezes persistimos em erros, somos renitentes, principalmente em não aceitarmos as ultrapassagens que a vida elabora à nossa revelia. Família, por exemplo. Os grandes clãs hoje estão todos se fragmentando em pequenos e mais eficiente grupos. A idéia de "eu pelos meus e contra o resto" esta sendo minada pela falta dos "meus". Ninguém mais pertence a ninguém ou a qualquer agrupamento, mesmo que consanguíneo. Família é valor que a pós-modernidade vai transformando no contexto social. Esta acabando aquela família como conhecíamos no século passado. Nos grandes clãs as pessoas se juntavam para se protegerem. Hoje não é mais preciso estar juntos para nos sentirmos protegidos. A casa familiar não é mais o refúgio seguro; não temos mais que temer os outros. Ou temos, mas é a polícia e a justiça que nos protege. A "vendeta" acabou; hoje vingança não é justificativa para violência e as leis são para todos os cidadãos. Há os que burlam, dinheiro e poder ainda determinam, em parte. Mas já temos ministros, executivos, políticos e poderosos nas prisões. Somos uma cidade, um estado, um país e um planeta.

O que existe é o que chamamos de família nuclear. Pai, mãe e filhos. Quem casa, hoje em dia (e não precisa ser de "papel passado"), quer ter sua casa, seu canto, seu espaço de privacidade. A casa própria, atualmente, é um bem acessível a qualquer um que lute seriamente por isso. Hoje a palavra chave é privacidade que cada vez fica mais difícil e custa mais caro.

Família agora é sentimento, é paixão.  Agrego pessoas à minha família que não são, nem de longe, parentes consanguíneos. A consanguinidade não é mais a razão dos laços afetivos. Tenho parentes consanguíneos paternos e maternos; tios, primos e até um irmão por parte de pai, que não tenho a menor vontade de ver ou saber. Pessoas que sequer respeito porque já me descriminaram e tiveram preconceitos contra mim. Não procurei família ao sair da prisão; eles todos haviam me abandonado. A família que tenho é aquela que construí a partir de minhas amizades. Tenho amigos que considero tanto quanto amo meus filhos. Pessoas que só me fizeram bem e ajudaram sempre.

Serei eterno devedor da amizade, afeto e dedicação com que eles cuidam de mim. Somos unidos porque nos faz bem, porque nos tornamos melhores, felizes e alegres quando juntos. Claro esta que nada é para sempre; mas também só existe o aqui e o agora, o resto é ficção, esperança e desejo.

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Luiz Mendes

02/05/2014.     

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