Que educação nós queremos?

por Rodrigo Vergara

E como vamos preparar as crianças para enfrentar os desafios do amanhã?

E como vamos preparar as crianças para enfrentar os desafios do amanhã? A julgar pelas ideias surgidas no evento de lançamento do prêmio Trip Transformadores 2013, em São Paulo, a escola do futuro será do tamanho do mundo, e todos nós seremos chamados a compartilhar o que sabemos

Aos 40 anos, a dona de casa Maria foi a uma escola pública do bairro do Grajaú, onde mora, em São Paulo, acompanhar o filho, que ia se matricular no ensino médio. Num estalo, decidiu retomar os estudos e matriculou-se também. Fez duas faculdades, pós-graduou-se, escreveu livro premiado, tornou-se professora e criou projetos sociais para levar arte e cultura ao bairro onde vive. A escola mudou sua vida. “Descobri em mim coisas de que eu não sabia que era capaz. O conhecimento me deu segurança para o desenvolvimento e isso se estendeu ao meu redor”, disse ela no palco do evento Sem Educação Não Tem Solução, realizado no fim de junho em São Paulo, que lançou oficialmente o prêmio Trip Transformadores deste ano.

Marina foi analfabeta até os 16 anos, quando deixou a comunidade rural onde vivia e foi para a cidade. Formou-se, tornou-se professora de história. Liderou professores contra a ditadura, elegeu-se vereadora, depois senadora, virou ministra e hoje é uma liderança reconhecida no mundo todo. “A educação de qualidade cria um novo sujeito político, capaz de se colocar no lugar em que está, com capacidade de se transformar e de transformar”, afirma.

As histórias de Maria, nascida Maria Vilani Cavalcante Gomes (e mãe do cantor Criolo) e de Marina, mais conhecida como Marina Silva, são daqueles exemplos que reforçam a importância da educação. Ambas reconhecem o papel do ensino formal na sua formação pessoal. Mas mesmo elas, que viveram a transformação do conhecimento em idade adulta, ou seja, foram testemunhas conscientes dos efeitos da educação em suas vidas, reforçam o coro cada vez maior dos que questionam a capacidade dessa instituição de nos levar adiante. Afinal, escolas, classes, aulas, disciplinas, provas, professores especialistas e currículo universal bastam para formar um indivíduo? Parece que não. Nunca houve tanta crítica ao conhecimento formal, aquele desenvolvido e validado nas universidades e nos institutos de pesquisa e reproduzido nas escolas.

Na opinião dos convidados ao evento, muitos deles professores, diretores e gestores da rede pública de ensino, parte da culpa é mesmo do sistema educacional, que muitas vezes se preocupa mais com os próprios interesses do que com os dos alunos. “Se queremos transformar a educação, a primeira coisa que temos que parar de pensar é na escola, porque ela reproduz a mesma velharia. A escola está na Idade Média, os conteúdos são antigos”, disse Tião Rocha, premiado educador mineiro, autor de uma série de tecnologias pedagógicas à margem da escola, que ele condena e combate. Ao seu lado no palco, Braz Rodrigues Nogueira, diretor de uma escola pública encravada na favela de Heliópolis, em São Paulo, concordava.

Braz é autor de uma pequena revolução na escola que dirige. Derrubou os muros que a cercavam para integrá-la à comunidade, retirou as paredes internas das salas e implantou uma metodologia inspirada na famosa Escola da Ponte, de Portugal. Em cada um dos salões que restaram, estudam juntos cem alunos, divididos em grupos de quatro estudantes. Ali, incentiva-se a autonomia de alunos e professores. 
Se há dúvida com a lição, o colega ajuda. Se não der conta, a tarefa é dos três professores presentes, independentemente da matéria estudada, o que quebrou a especialização. “Concordo com o Tião. A escola não pode ter o monopólio do conhecimento. Ela se colocou nesse lugar, mas, como não dá conta, fica todo mundo empurrando a culpa, do professor para o diretor, para o secretário, para o prefeito . Educação é responsabilidade de toda a sociedade”, disse Braz.

CRISE CIVILIZATÓRIA

Fechando o trio de educadores sobre o palco estava Julio César da Rocha, secretário de Educação da prefeitura de Sobral, no Ceará, que se destacou por conseguir, em quatro anos, um enorme salto no desempenho escolar dos alunos, hoje comparável aos de países desenvolvidos. Antes, metade dos alunos do segundo ano do ensino fundamental não sabia nem ler palavras, que dirá textos. Agora, 97% compreendem textos. O segredo, disse ele, foi dar condições e autonomia para a escola e o professor. Autointitulando-se o mais “quadradinho” dos educadores sobre o palco, Julio ainda acha que a escola é a instituição que consegue levar a todos essas conquistas. “Se é verdade, como diz o Tião, que educação se faz em qualquer canto, por que não também na escola?”

Para a ex-senadora Marina Silva, que fechou o evento com uma palestra sobre educação e sustentabilidade, a crise das escolas é fruto de uma crise maior, sistêmica. “Estamos atravessando uma crise civilizatória. E crises civilizatórias não são fáceis de ser enfrentadas, porque não temos um repertório de experiências para acessar”, disse. 
Diante de problemas inéditos, teremos que construir juntos as soluções. “A verdade não está com nenhum de nós, a verdade terá que ser tecida entre nós”, disse ela. Mais do que isso, vamos ter que aprender a conviver com um grau de incerteza maior, porque, diferentemente do ensino tradicional, desta vez não haverá uma única resposta certa para cada pergunta. E elas não serão definitivas, porque o cenário vai continuar mudando rapidamente, impulsionado, entre outras coisas, pelas novas tecnologias de comunicação, como a internet.

ESCOLA DO FUTURO

Marina ecoava as palavras de outro convidado da noite, o neurocientista Sidarta Ribeiro. Focado nas novas descobertas sobre como o cérebro aprende, Sidarta disse que a democratização do conhecimento trazida pela internet “é o que faltava para tornar este planeta um lugar interessante e transformar-nos em uma civilização que respeita o outro”.

A escola do futuro, disse ele, ainda vai reproduzir muitas das tecnologias de hoje, como a alfabetização baseada em fonemas e morfemas, cuja eficiência tem sido comprovada pela neurociência com base em dados objetivos. E até as provas mostram ter eficácia, aumentando a consolidação da aprendizagem. Mas há muito o que evoluir. A escola, diz ele, terá que ser mais carismática e empolgante, se quiser transmitir conhecimento. Os professores terão que ser mais motivados, inclusive financeiramente. E os alunos deverão dormir no período letivo. Isso mesmo, dormir. Estudioso do sono, Sidarta diz que o sono e o sonho estão diretamente associados ao aprendizado. Logo após uma aula interessante, os alunos deveriam ser colocados para dormir, para aprender melhor.

A cobertura do evento e todas as notícias sobre Trip Transformadores estão no site

O Prêmio Trip Transformadores é apoiado por marcas com princípios alinhados à iniciativa e a seus homenageados. Este ano o prêmio é patrocinado pelo Grupo Boticário, nosso parceiro desde 2008, e Itaú, conosco desde 2011. Apoiado por Audi, Academia de Filmes, Suzano Papel e Celulose, Almapp/BBDO, H2OH!, Gol Linhas Aéreas Inteligentes e pela Rádio Eldorado FM 107,3.

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