Uma noite de transfomação

por Redação

Ares de mudança inspiraram o Auditório Ibirapuera na noite de premiação

Aconteceu nesta quarta-feira, 26 de outubro, no Auditório Ibirapuera o Prêmio Trip Transformadores 2011. Em sua quinta edição, o prêmio criado em 2007 homenageia pessoas de diversas áreas que encabeçam iniciativas que modificam realidades para melhor.

Sob o comando do mestre de cerimônias Lee Taylor, a noite teve como primeiro discurso a fala do editor da Trip, Paulo Lima. “Essa é uma noite super especial por natureza pois estamos comemorando hoje oficialmente os 25 anos de lançamento da revista. É o quinto ano dessa festa que já nasceu pra comemorar os 20 anos da Trip. A ideia era de que pudéssemos olhar pra fora e descobrir gente que seguisse os mesmos valores que os nossos.” 

Sozinho no palco, o lendário cantor, compositor e percussionista Wilson das Neves segurando apenas uma caixa de fósforos emocionou a platéia do Auditório na primeira apresentação musical da noite. Ele cantou uma canção que fez em parceria com Paulo César Pinheiro, “Pra Gente Fazer Mais Um Samba”. 

O primeiro homenageado da noite foi o neurocientista Miguel Nicolelis, que lidera pesquisas para o tratamento do Mal de Parkinson, esquizofrenia e da recuperação de pacientes com lesões na medula. Fernando Chacon, diretor de marketing do Itaú, entregou o prêmio. Ao agradecer, Nicolelis disse que é apenas o porta-voz de alunos, médicos e cientistas que tanto nos Estados Unidos e no Brasil encapsulam a ideia de que o impossível pode ser factível. “Ciência pode ser uma ferramenta na busca da felicidade da humanidade”, completou.

“Ciência pode ser uma ferramenta na busca da felicidade da humanidade” - Miguel Nicolelis

A segunda premiada foi Alcione di Albanesi, criadora da ONG Amigos do Bem, que dá infraestrutura para uma vida digna a comunidades esquecidas para que elas desenvolvam atividades econômicas. Quem entregou o troféu foi Vasco Luce, presidente da PepsiCo. Muito emocionada, Alcione afirmou que fazer o bem não é fácil, mas que ninguém constrói nada sozinho. “Temos um lema se não posso fazer tudo o que devo, devo ao menos fazer tudo que posso”, disse.

Na sequência, subiu ao palco o judoca Flávio Canto, que coordena o Instituto Reação. Por meio dele, jovens de comunidades carentes do Rio de Janeiro entendem o valor da disciplina, da humildade e do respeito ao próximo. Para a entrega, foi convocado Ricardo Khauaja, vice-presidente de gestão e pessoas da Gol. No backstage, o judoca disse: “o Reação transformou mesmo a vida de todo mundo, inclusive a minha. Eu tive uma revolução de valores, de olhares, de sonhos. Hoje eu não consigo me imaginar sonhando só para mim. Hoje eu sou muito mais rico do ponto de vista de vida do que antes.”

Na segunda apresentação musical da noite, a bela e talentosa Bárbara Eugênia que, acompanhada de sua banda, cantou “Vaca Profana”, de Caetano Veloso.

O quarto homenageado foi Pablo Capilé, criador do Circuito Fora do Eixo, que começou como uma rede de coletivos de produção cultural independente e hoje se multiplica em um centro de cultura e tecnologias sociais. Para entregar o seu prêmio, a apresentadora e cineasta Marina Person. Sobre qual o primeiro passo para ser um transformador, Capilé revelou que só é preciso uma coisa: “não ter medo.” E completou: “Independente de onde você estiver você pode protagonizar”.

Emocionada com os ares transformadores, a atriz, diretora e escritora Bruna Lombardi entregou o prêmio a João Cândido Portinari. Em vez de agir como mais um entre tantos herdeiros, ele decidiu dedicar-se reunir e organizar a obra completa de seu pai e disponibilizá-la digitalmente aos brasileiros, e assim preservar a obra de um dos maiores pintores do País. “Para transformar, a primeira coisa é tomar conhecimento de quem já deu o primeiro passo, tentar fazer uma corrente. A palavra mágica aqui é o trabalho coletivo. É como o meu pai dizia: ‘Nós somos como os mourões de cerca. Só nos sustentamos em pé porque estamos ligados uns aos outros." João Cândido revelou que trará ao Brasil em fevereiro de 2012 a obra-prima de Portinari, o painel Guerra e Paz, em homenagem aos 50 anos da morte do grande pintor.

Fernando Luna, diretor editorial, e Carlos Sarli, diretor superintendente da editora Trip, entregaram o prêmio para Leonardo Sakamoto. À frente da ONG Repórter Brasil, Leonardo denuncia violações de direitos humanos e da legislação ambiental e investiga quem se beneficia com o crime. Foi dele um dos discursos mais contundentes da noite: “dedico este prêmio ao engavetadores do PEC do Trabalho Escravo. Aos deputados e senadores que estão rasgando o Código Florestal Brasileiro. Aos jovens que espancam homossexuais nas ruas. Dedico também os madeireiros que assassinam de forma covarde. Quero que todos tenham uma vida longa e saudável pra que possam assistir de camarote que o ódio que eles tanto semeiam NÃO vai prosperar”.

O sétimo prêmio foi uma homenagem póstuma a Maria do Espírito Santo e José Claudio Ribeiro da Silva. O casal ajudou a fundar um assentamento agroextrativista para ajudar outras famílias a viver da floresta, o Praia da Alta Piranheira, no Pará. No início deste ano, foram silenciados à tiros de escopeta. A suspeita recai sobre um fazendeiro quer queria explorar ilegalmente lotes do assentamento. Para a homenagem, foi convocado Raí, que pelo seu trabalho com a Gol de Letra, foi premiado no Transformadores de 2010. Antes ainda do crime brutal que tirou suas vidas, o ex-jogador os havia indicado ao prêmio. Para receber as homenagens, subiram ao palco Laísa, irmã de Maria, e Claudelice, irmã do José Cláudio.

"Eles sempre diziam que eram os beija-flores daquela localidade, que não podiam mudar o mundo mas podiam contribuir pro surgimento de mentes pensantes capazes de mudar o mundo. Estamos passando por um momento de luta e peregrinação, inclusive sendo ameaçadas. Que a vergonha de nosso Código Florestal seja pensado de fato", disse Claudelice, com a voz embargada.

Vinda do Grajaú, periferia de São Paulo, a cantora e compositora Andrea Dias abrilhantou a noite cantando “Vai (Menina, Amanhã de Manhã)”, do gênio baiano Tom Zé.

Nilson Garrido, ex-segurança, ex-pugilista, descobriu uma nova vida com o boxe e decidiu compartilhar o que aprendeu em um projeto erguido com o que estava à mão. Hoje, com o Instituto Cora-Garrido e duas academias montadas sob viadutos da cidade, dá abrigo e orientação a quem passar por ali, de moradores de rua a dependentes químicos. Para lhe entregar o Trip Transformadores 2011, Paulo Kakinoff, presidente da Audi no Brasil. Depois de dedicar o prêmio à sua parceira de batalhas, Cora Batista, Garrido disse nos bastidores que o prêmio: “faz as nossas palavras ecoarem em outros lugares através da mídia, de forma que está sendo plantada a semente daquilo que a gente queria. Faz o povo sentir que não é preciso ter dinheiro para se fazer algo pela humanidade. O senso de ajudar ao próximo vem do coração, sem querer nada em troca."

Em 2006, Renato Sérgio de Lima ajudou a fundar o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, que surgiu para facilitar a conversa entre as polícias civil e militar, juristas e sociólogos. Em pouco tempo, conseguiu transformar um ambiente contaminado por verdades absolutas em um espaço de troca e aperfeiçoamento de ideias. Ele recebeu o troféu das mãos de David Feffer, presidente da Suzano Papel e Celulose, e da apresentadora Sabrina Sato. Lima disse que é possível pensar na segurança como algo que garante direitos e que batalha por um País sem violência. “Esse prêmio renova a energia para a luta diária de que é possível sim construir um diálogo, aproximar segmentos, acreditar que trabalhar em rede, acreditar na transformação, é sem dúvida nenhuma algo bastante positivo.” 

O décimo homenageado da noite foi o jornalista, escritor e professor universitário baiano Jean Wyllys. Eleito deputado federal no ano passado pelo Rio de Janeiro, ele tem se destacado na defesa da diversidade e dos direitos humanos. Paulo Camossa, diretor geral de mídia, e Marcello Serpa, sócio-presidente e diretor de criação da Almap BBDO, subiram ao palco para entregar o prêmio a Jean. 

"Essa noite significou muito para mim e para a comunidade da qual eu faço parte. Esse prêmio significa sair da subalternidade. Essa premiação é o oposto de tudo isso. É a visibilidade positiva, é o reconhecimento de que a orientação sexual não determina caráter e nem impede que alguém transforme ou participe do debate. Isso é muito significativo, não só para mim mas para toda a comunidade gay”, disse Jean nos bastidores.

O cantor e compositor Luiz Melodia fez a próxima apresentação musical da noite. Cantou “Só Assumo Só”, que traz os apropriados versos para a noite transformadora: “Olha, ô gente, me respeita / Sou de tudo ou nada Sou de uma só / De uma terra depressiva / Mas de uma beleza para minha avó / Vejo o novo mal sambista / Camisa de listra, ou de paletó / Repare e arregala o olho / Que um novo artista / Vai cantar tão só”.

Maurizélia de Brito Silva, a Zélia, foi a décima primeira premiada. Há 15 anos a chefe da Reserva Biológica do Atol das Rocas, no Rio Grande do Norte, dedica sua vida a zelar por esse berçário vivo de espécies que precisa ser preservado da pescaria ilegal. O apresentador Luciano Huck, velho amigo da Trip, subiu ao palco para entregar o troféu. “Lá no Atol a gente fica muito isolado, por ser uma área que não tem visitação e nem turismo.  Então estar aqui, no meio de pessoas de todas as áreas e poder mostrar o seu trabalho em uma situação onde ele está sendo premiado, vai abrir muitas portas. E eu espero que essas portas se abram e não se fechem mais”, disse a homenageada.

O penúltimo homenageado foi o estilista Ronaldo Fraga, dono de uma consagrada grife com o seu próprio nome. Ele foi premiado pelo projeto Talentos do Brasil, iniciativa que resgata técnicas artesanais quase perdidas de grupos de artesãos espalhados pelo país. Para lhe dar o prêmio subiu ao palco Malu Nunes, diretora executiva da Fundação e gerente de Responsabilidade Social Corporativa e Sustentabilidade do Grupo O Boticário. Ronaldo se disse “emocionado, impactado e silenciado por tantas histórias transformadoras. E foi a face transformadora da moda que me fez mexer com roupa e não com roscas de parafuso. O segundo setor que mais emprega no Brasil é muito conhecido como fonte de renda, mas pouco conhecido como modo de transformação social.” 

Encerrando a premiação, Lee Taylor apresentou o último homenageado da edição 2011 do Prêmio Trip Transformadores, Cesare de La Rocca. O italiano idealizou e fundou o Projeto Axé, em Salvador, Bahia, que atende crianças e jovens, a maioria em situação de rua. Para resgatar essas crianças criou a arte-educação, metodologia que utiliza a cultura como veículo de cidadania e tem sido seguida e propagada em milhares de outras iniciativas espalhadas pelo país. O presidente da Alpargatas, Márcio Utsch, apresentou a homenagem. Após ser aplaudido de pé, La Rocca declarou: “Para mim, isso é a coroação de um sonho. Eu fui sempre um grande sonhador, só que sempre com uns pés no chão. Prêmios como esse provam que, mesmo velho, vale a pena sonhar.”

Uma belíssima jam reunindo Barbara Eugênia, Andréia Dias, Wilson das Neves e Luiz Melodia encerrou a noite. Eles cantaram “Magrelinha”, clássico do repertório do carioca de Estácio, Melodia. Entremeado por trechos do Hino Nacional Brasileiro, os versos “O por do sol vai renovar brilhar de novo o seu sorriso / E libertar da areia preta e do arco-íris cor de sangue, cor de sangue, cor de sangue” encerraram a noite com perfeição.

O Prêmio Trip Transformadores 2011 teve como patrocinadores Grupo Boticário e Itaú e apoiadores: Audi, Suzano Papel e Celulose, H2OH!, ALMAP BBDO, Grupo INK, Eco Futuro, Timberland, O Estado de São Paulo, Rádio Eldorado e Gol Linhas Aéreas.

(por Flávia Durante)

Veja na galeria abaixo as fotos da premiação.

 

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