Uma década de Cooperifa

por Redação

Um lugar tido como o pior do Brasil vive de sua efervescência cultural de base popular

O evento cultural mais famoso da periferia de São Paulo, o sarau da Cooperifa, completou 10 anos semana passada em grande estilo, com uma semana de eventos que incluíram de dança a orquestra sinfônica. Realizado em Piraporinha, zona sul da capital paulista, no boteco do Zé Batidão, os saraus da Cooperifa reúnem semanalmente, às quartas-feiras, cerca de 500 pessoas que se acomodam por ali para ouvir e participar das sessões de poesia, literatura, música e outras atividades.

“O projeto Cooperifa leva literatura para desenvolver o exercício da cidadania. Quando você se torna cidadão, começa a mudar a estrutura do bairro e daí do país. Mesmo adorando o deus chamado trabalho, as pessoas precisam de arte e cultura para sobreviverem porque são complemento da cidadania”, diz o poeta Sérgio Vaz, o pioneiro organizador do encontro, vencedor do Prêmio Trip Transformadores de 2010.

Para celebrar uma década do projeto e ampliar a potência das pedradas, organizaram a IV Mostra Cultural da Cooperifa, com cerca de 30 atividades, entre espetáculos de dança e de música, orquestra sinfônica, debates, sessões de cinema e teatro realizados em escolas estaduais e municipais e em centros de educação e cultura na região. Tudo gratuito e aberto para gente de todas as idades.

A mostra revela a capacidade de articulação e organização da galera e toda riqueza de expressões culturais da periferia, assim como o fôlego para distribuir-se por vários centros das comunidades da zona Sul de São Paulo.

“Os saraus vêm se espalhando e se juntando a outros movimentos, como a Agência Cultural Solano Trindade, economias solidárias, entre outras, e certamente têm promovido uma verdadeira revolução nada silenciosa e já reconhecida pela sociedade brasileira e internacional”, conta Celso Sekiguchi, empreendedor social na área de economia solidária e educação democrática do Instituto Politeia.

Atualmente, existem cerca de 60 saraus na cidade, frutos de iniciativas culturais populares. Sérgio Vaz compara o fenômeno dos saraus com a efervescência cultural que a classe média viveu nos anos 60 e 70, “só que de uma forma mais plural, mais democrática, com negros e pobres e não menos criativa”, nas palavras do poeta. “Estamos descobrindo o nosso cinema, nosso teatro, estamos criando uma linguagem artística própria, uma música que é o rap, realizando mostra de cinema com filmes produzidos ali e fazendo livros da literatura periférica. Os saraus hoje em dia são células culturais”, conta, entusiasmado Sérgio Vaz, o colecionador de pedras.

Antigamente, as pessoas ascendiam socialmente e queriam se mudar da periferia, hoje elas querem ser referência e mudar a periferia. A notoriedade de Vaz também lhe trouxe uma expressiva venda de livros, especialmente na própria periferia, além de palestras Brasil a fora. Mas ele garante que a arte não é a salvação da lavoura, ela faz parte da natureza humana e não deve ser o ganha pão. A arte existe mesmo para transformar vidas.

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