Trabalhar muito é cafona

por Nina Lemos
Tpm #130

“Tô sem tempo.” Se você diz isso o tempo todo, pobrezinha...

Este artigo integra a reportagem Pau na mesa pra quê? O mundo do trabalho foi desenhado pelos homens. Pelo número de reclamações, não tem funcionado bem. Como as mulheres, que ganham cada vez mais espaço nas empresas, podem mudar essa situação?


“Como você anda?” “Ah, trabalhando muito.” Sempre que ouço essa frase, proferida em tom de orgulho, como se trabalhar muito fosse chique, tenho vontade de responder: COITADA, QUE PENA, NOSSA, QUE COISA HORRÍVEL. PRECISA DE ALGO? CALMA, ESSE PERÍODO JÁ PASSA. Nunca fiz isso. Nunca dei a resposta dos sonhos. Motivo: tenho medo de apanhar ou fazer alguém chorar.

Isso porque sempre que alguma menina descolada ou algum garoto cool vem com essa frase, tenha certeza, eles estão tirando onda. Enchendo a boca. TRABALHO MUITO. Trabalhar demais é sinal de status. A mesma coisa que ter todos os produtos da Apple e ter uma bolsa de grife.

Pobres coitados. Trabalhar muito é horrível. A não ser que você queira uma ótima desculpa para ter uma vida ruim e não ser uma pessoa legal. Quem trabalha muito não pode arrumar um namorado (ou passar tempo com ele, se tiver um), pegar o filho na escola. E, claro, ver os amigos. Ver os amigos é a coisa mais importante do mundo. E se você trabalha MUIIIITO, pobre coitada, você deixa seus amigos na mão. E isso é uma coisa que nada paga. Mesmo.

Isso é bonito? Não, isso é horrível. Mas, pelos restaurantes dos Jardins, as meninas continuam enchendo a boca pintada com batom da M.A.C para dizer: “Não tenho tempo, estou trabalhando muuuuuuuiiiito”.

Bem, se você quer fugir da vida, essa é uma ótima desculpa. Trabalhar muito é a única desculpa aceita para não viver. Não vejo os amigos porque trabalho muito. Não tenho namorado porque trabalho muito. Se o seu emprego for bom e você ganhar bem, o mundo vai te aplaudir.

Não, trabalhar muito é ruim. Viver é MUITO melhor, eu grito, também com batom M.A.C. Afinal, por um tempo, eu andei TRABALHANDO MUITO. Mas, como prefiro viver, caí fora.

*Nina Lemos tem 42 anos, trabalha bastante, mas não abre mão de viver
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