Sugar lovers: pagando bem, que mal tem?

por Natacha Cortêz

O que leva mulheres ricas, poderosas e com idades entre 35 e 65 anos a procurarem por companhia paga? Conheça as Sugar mommies

Há quem acredite que amor e negócios não devem andar juntos. Para esses, a rede social Meu Patrocínio, que tem como base justamente a união das duas coisas, pode parecer uma afronta. Lançada no Brasil em novembro de 2015, a plataforma de encontros une endinheirados a candidatos que aceitam (muito bem, obrigado) ser mimados com presentinhos e até mesadas.

São 21 mil sugar daddies e 1000 sugar mommies (os que bancam) para milhares de babies (os que são bancados), mulheres e homens. Para se inscrever na plataforma, daddies e mommies pagam planos mensais que custam R$ 199 ou R$ 999 – quem desembolsa mais entra para um grupo de elite, uma espécie de camarote. Para os babies, não há custo.

O site ainda não tem como verificar o poder financeiro dos daddies e mommies, mas está trabalhando em como fazer isso. É o que promete sua CEO e fundadora, a norte americana filha de brasileiros, Jennifer Lobo, de 29 anos. “Num futuro breve, pretendemos garantir essa clareza. Hoje, os preços que as pessoas pagam pelas mensalidades é o que mostra, pelo menos no primeiro contato, que ela também pode bancar um estilo de vida de alto padrão.”

Jennifer sabe do que fala quando o assunto é “relacionamento sugar”. Foi baby pela primeira vez aos 20 anos, quando morava em Nova York, e nunca abriu mão da dinâmica. Atualmente, não é inscrita no próprio site apenas porque já tem um daddie pra chamar de seu. “Nos EUA, o olhar das pessoas pro universo sugar já é um olhar acostumado. Há os que torcem o nariz, mas não há os que se assustam”, diz.

O número baixo de mommies (4,7% do total de daddies) traz pistas: as mulheres só puderam se inscrever como “financiadoras” a partir de abril de 2016 e graças ao “grande número de pedidos”, diz a assessoria da rede. Além disso, “normal mesmo é ver homem mais velho acompanhado de garota novinha”, acrescenta Jennifer. Por isso, ao trazer o serviço pro Brasil, a empresária decidiu começar pelo arranjo mais conhecido, e por que não, mais aceito: daddies e babies mulheres. “Foi só uma estratégia de implementação por aqui.” Não anunciar o serviço pra mommies na home do site também foi estratégia. “Preferimos separar uma aba mais discreta só pra elas. E também, as mommies chegam muito por indicação de outras mommies. É assim que normalmente são convencidas a se inscrever.”

Mesmo novatas na plataforma, as mommies já têm na ponta da língua o que leva mulheres ricas, poderosas e com idades entre 35 e 65 anos a procurarem por companhia paga: solidão, uma boa dose de clareza para lidar com relações que envolvem um lado com muita grana e o outro sem, e um certo cansaço com os arranjos tradicionais. Segundo dados reunidos dos perfis do Meu Patrocínio, a renda média mensal declarada pelas mommies é de R$ 35 mil, enquanto o patrimônio médio é de R$ 4,2 milhões. Já os daddies declararam uma média de R$ 47 mil mensais e R$ 7,1 milhões em patrimônio.

“Ninguém paga pra estar em uma rede social de encontros, que prioriza o filtro dos candidatos, se não for pra, no fundo, se apaixonar ”

Diferente de serviços de acompanhantes e prostituição, este tipo de rede social incentiva a continuidade dos encontros e a exclusividade dos envolvidos. Por isso, falar de amor não é tão absurdo assim. “Até porque, o que move as pessoas é o amor”, explica Celina [o nome foi mudado a pedido dela], 52 anos, dentista, 4 meses como sugar mommie. “Ninguém paga pra estar em uma rede social de encontros, que é rigorosa com o filtro dos candidatos, se não for pra, no fundo, se apaixonar.”

Ainda assim, e que fique claro, os acordos na rede são sobretudo financeiros. Amor é bom e vem depois. A seguir, 3 mommies e 2 babies homens contam o que está realmente em jogo.

LEIA TAMBÉM: Casamento freestyle

A seguir, três mommies e dois babies homens contam o que está realmente em jogo.

Aprendi a me divertir com os mais jovens
Ana*, 48 anos, executiva da indústria de alimentos

“Fui casada por 22 anos e há cinco estou divorciada. Tenho um filho de 20 anos, que foi pra Nova York estudar. Moro sozinha em São Paulo e entrei no site pra procurar algo que me desse alegria na vida. Pago o plano básico (de R$ 199) e estou no site há seis meses. Antes, frequentei o Par perfeito e o Tinder, mas não gostei de nenhum, porque parece que os homens da minha idade não querem conversa comigo. Talvez por isso tenha aprendido a me divertir com os mais jovens. Mas há um problema: na vida ‘real’, os novinhos não assumem que estão interessados também no meu dinheiro. Como sugar mommie, as cartas estão na mesa; sei o que a outra pessoa deseja desde o início. Gosto de homens que têm cerca de 30 anos. Esta faixa tem mais sintonia comigo. Conheci um rapaz no site e nosso envolvimento durou três meses. Engatamos uma viagem em seguida da outra, fomos a Paris, Madri e Roma e ficamos uma semana em cada cidade. Terminei porque ele ficou grudento e estou numa fase mais livre. Não é bem um namoro sério o que busco agora. Tenho condições de proporcionar muitas coisas para os rapazes com quem saio, mas não vou chegar a fazer planilha de pagamento, não vou contar o dinheiro. Tem que acontecer naturalmente. Os acordos financeiros são importantes, mas não são tudo. Tem que ter admiração, tem que ter algum sentimento. Eu tenho que gostar de estar com a pessoa, e tenho que sentir que ela também gosta de estar comigo. Ah, meu filho nem sonha que estou inscrita no site. Não é que tenho vergonha de contar, só não falamos dos meus relacionamentos.”

LEIA TAMBÉM: Amor com benefícios

Casamento é muito abusivo
Bruna*, 45 anos, diretora financeira em uma marca de cosméticos
“Fui casada por sete anos e tem dois que sou divorciada. Desde então, busco relacionamentos que não sejam tão abusivos quanto os casamentos podem ser. Fiquei sabendo da rede social através de uma amiga e fui atrás pra entender o que seria uma sugar mommie. Quis tentar. Interagi virtualmente com uns 12 rapazes, mas conhecer pessoalmente, foram três. Agora, estou saindo com um, ele tem 25 anos – a metade da idade do meu ex-marido. Sou independente financeiramente, tenho minha casa, meu carro, viajo quando quero.

“Busco relacionamentos que não sejam tão abusivos quanto os casamentos podem ser”

Os homens mais velhos não gostam de mulher assim. Eles têm preconceito com mulher bem-sucedida. Acho que não gostam do que não podem controlar.

Já os sugar babies sabem que você tem dinheiro, que você topa bancar coisas e que os dois lados ficam confortáveis com isso. Também sei quem são os babies e o que querem. Pra esse rapaz com quem estou saindo, já pago a faculdade. Decidimos depois de sair umas cinco vezes, quando já nos gostávamos. A ideia partiu de mim, quis ajudar com algo que pudesse fazer ele crescer comigo. Não exijo fidelidade dele, exijo respeito. Por enquanto é assim.”

“Os acordos financeiros são importantes, mas não são tudo. Tem que ter admiração, tem que ter algum sentimento”

Mulheres da minha idade: façam o que bem entenderem
Paola*, 43 anos, empresária do ram

o da beleza
“Fui casada por 15 anos, mas não tivemos filhos. Faz um ano que estou separada e quatro meses que uso o site. Pago a assinatura básica (R$ 199). Tenho amigos que usam o Tinder, mas lá eu não teria a privacidade protegida. Não tenho que conectar nenhuma conta de rede social, pude criar um e-mail só pra usar no site, obviamente também não uso meu telefone pessoal pra falar com os rapazes. É curioso você pagar um site pra conhecer pessoas que podem estar apenas interessadas no seu dinheiro. Não vou dizer que não rola uma desconfiança, uma insegurança, mas é só até você começar a sair com alguém. Depois as coisas ficam mais claras e você se sente confortável com esse papel de bancar tudo. Com o primeiro rapaz com quem saí foi nítido o exclusivo interesse no meu dinheiro e por isso não teve segundo encontro. Semana passada me encontrei com o quarto rapaz. Não estou procurando só sexo, mas uma companhia, alguém que goste das coisas que gosto. E as coisas de que gosto não são nada baratas: os melhores restaurantes, bons hotéis. Se disponho de condições, não vejo por que não arcar com todas as despesas – as minhas e as do meu parceiro. Os homens fazem isso o tempo inteiro e não são questionados. Homens bancam mulheres desde que o mundo é mundo, mas o contrário ainda incomoda. Aliás, só estou dando esta entrevista para que mulheres da minha idade, que estão sozinhas porque os homens da nossa idade não querem saber da gente, possam fazer o que bem entenderem. Eu pagaria qualquer coisa que fizesse um homem se desenvolver: uma faculdade, um mestrado fora, viagens. Ou seja, o contrário do que os homens procuram nas mulheres – que é deixá-las cada vez mais dependentes deles –; eu quero é que quem esteja comigo seja cada vez mais independente.”

LEIA TAMBÉM: A cor mais quente

Rola respeito
Américo*, 26 anos, publicitário
“Sou de Santa Catarina, vim pra São Paulo pra fazer faculdade e agora estou terminando o curso de publicidade. Trabalho em uma agência focada na produção de aplicativos. Tem uns cinco meses que uso o site. A sugar mommie com quem estou saindo agora diz que tem 38 anos, mas acho que ela tem mais de 40. Até porque ela tem um filho quase da minha idade. É uma mulher bonita, ‘inteira’, trabalha em banco, deve ter muita grana. A gente foi se beijar depois de três encontros e ainda não transamos, mas acho que vai acabar acontecendo. Ela é muito calma, experiente e temos ótimas conversas: falamos sobre trabalho, carreira, futuro. Não rola uma coisa maternal, rola respeito mesmo. Com ela, percebi que a gente tem que tratar mulher diferente, considerar que elas podem ser tão poderosas quanto os homens. Nós não chegamos a falar de mesada ainda, mas ela já me deu alguns presentes. Nada muito caro: um tênis, umas camisas e umas calças. No primeiro encontro, ela pagou a conta. Pedimos vinho, champanhe, quase varamos a madrugada. Deu uns mil reais. Eu nunca tinha saído com uma mulher que paga a conta. As pessoas têm muito preconceito em relação aos sugars porque envolve dinheiro. Não fico contando pros meus amigos, nem pra quem trabalha comigo, que sou um sugar baby.”

Muitos além dos presentes
Richard, 22 anos, estudante universitário

“Nesse pouco tempo que a gente tá junto, ganhei algumas roupas e um iphone”

“Cresci em Minas Gerais mas moro em São Paulo há quatro anos. Sou universitário e vida de estudante é dura, você ainda não tem o poder aquisitivo que deseja. No geral, não tenho paciência com menina novinha. O fato de eu ter conhecido uma mulher mais madura e ser mimado por ela me convenceu a usar uma rede social. Hoje estou saindo com uma mulher bem bonita que não diz a idade, deve ter mais de 40. Só meu melhor amigo sabe que estou fazendo isso. Continuo saindo com os meus amigos, vou pra balada e, se quiser, posso ficar com outras pessoas. Não quero ter as cobranças de um relacionamento tradicional. E essa mommie tem essa vibe. Ela perguntou se eu me sentiria confortável ganhando presentinhos, eu disse que super. Em um mês juntos, ganhei algumas roupas e um iPhone. A gente ainda não fez sexo e nem rola essa necessidade de chegar. Se acontecer, vou me sentir confortável porque gosto dela.”

*Os nomes foram trocados a pedido dos entrevistados.

LEIA MAIS: Morrer de amor e continuar vivendo

De volta ao jogo

Por Maria Lucia Homem**
“Existe um efeito benigno na mercantilização do amor entre mommies e babies. É o de devolver à mulher mais velha o lugar de objeto de desejo que teve na juventude. Se ela pode prover, se pode bancar, readquire o direito de entrar no mercado dos corpos úteis para as trocas afetivas sexuais. É erotizada novamente e volta a ser uma player. Pode ser uma maneira tortuosa de se reingressar, não muito nobre? Se você pensar que fazendo isso abrimos mão de criar vínculos em detrimento de criar acordos que mais se parecem com fazer negócios, sim. Mas os homens fazem isso desde sempre, não?! Alguém questionou se seria nobre?

Mulheres ricas não precisam mais envelhecer sozinhas quando existe um serviço como o Meu Patrocínio. Basta pagar e estar conectada. E é indiscutível: o envelhecimento é desfavorável para as brasileiras, que devem ser jovens e reprodutoras para ter valor erótico. Caso contrário, lhes restam a solidão e a invisibilidade.

De qualquer forma, é sempre bom lembrar que jogos de poder permeiam todo tipo de relação, não apenas as que envolvem acordos financeiros. A pergunta ‘será que você me deseja tanto quanto deseja o meu dinheiro?’ existe em qualquer arranjo. Não dá pra escapar dessa dinâmica.”

** Maria Lucia Homem é psicanalista

fechar