Somos todas divinas e pronto

por Giulia Garcia

A fotógrafa Mariana Cobra retrata a beleza na diversidade dos corpos latino-americanos em seu projeto Divinas

Fotos sem retoques de mulheres plenas e seguras de si, em lingeries delicadas. A proposta não é simplesmente um ensaio sensual, é principalmente mostrar a diversidade de corpos e contrapor os padrões de beleza. Assim, com esse desejo em mente, nasceu Divinas. O projeto fotográfico é uma produção independente de Mariana Cobra, que pretende retratar as mulheres reais de toda a América Latina. “Todas [as fotos] são analógicas e isso faz parte do conceito, para ninguém ficar olhando, ver se está boa. Era uma relação de confiança, as meninas confiam em mim e confiam nelas mesmas”, conta.

Foi durante o processo de seu último curta-metragem, O Remorso, que a paulistana ficou instigada a refletir sobre o conceito de beleza e os julgamentos estéticos femininos. O estalo veio em algumas conversas entre as envolvidas na produção, em que compartilharam dores, medos e histórias. E um estupro coletivo no Rio de Janeiro foi o estopim.

A discussão sobre os corpos afetava todas as classes sociais e à medida que a vítima era tratada como culpada por pessoas de ambos os gêneros, mais inquieta ficava a artista. “Quando as mulheres têm essa atitude preconceituosa com outras, me mata”, explica.

LEIA TAMBÉM: A fotógrafa paulista Mari Rosa busca um olhar não sexualizado do corpo feminino

Em meio aos protestos, a arte foi a forma escolhida por ela para manifestar sua indignação e conseguir se conectar com o feminino, com as mulheres em sua diversidade. O projeto pretende, com muita sensibilidade, convidar as pessoas a olhar para a beleza sob outra perspectiva, sem qualificar o diferente. “A mulher tem preconceito com outra porque ela sempre vê a outra como vagabunda, ou gostosa, ou gorda, sempre tem um adjetivo”, explica.

A diversidade a que Mariana se refere não tem fronteiras, por isso suas lentes foram voltadas para toda a América Latina. E vem daí também a escolha pela palavra “divinas”, partilhada pelo português e pelo espanhol. “A gente é tão parecido culturalmente, mas é tão distanciado pela língua e sempre teve uma vontade minha de unir”, explica.

Apesar das particularidades de cada povo, a colonização patriarcal é algo comum na região. Assim como os territórios, os corpos latino-americanos foram colonizados e escravizados e isso se tornou o material de estudo da fotógrafa, que em Divinas busca uma apropriação dos corpos por suas verdadeiras donas.

Primeira parada, Uruguai

A primeira edição, em formato de zine, com design da Bo Brega, é sobre o Uruguai. Para Mariana, apesar do país ser visto como vanguarda, de população culta e politizada, existe um preconceito velado, que ela conseguiu observar durante sua passagem por lá.

Em outra viagem, para a Argentina, notou como as diferenças nacionais transpareciam em suas fotografias, pelo visual arquitetônico que as ambientava e as curvas e cores dos corpos femininos que as compunham, refletindo a história de migração e as preocupações de cada sociedade.

O próximo objetivo é o Brasil, que, por seu tamanho e miscigenação, exige calma, viagens e muito estudo. “Eu quero ter toda a diversidade, com certeza. A gente normalmente está muito presa nesse eixo Rio-São Paulo. Temos 52% de mulheres negras e isso tem que refletir no projeto”, afirma.  

Em meio à diversidade de corpos, uma ideia de Mariana era comum para todas: “Meu único pedido para as meninas era sempre olhar pra câmera. Pra mim é um detalhe muito sensível que faz toda diferença e é muito forte. Essa coisa de olhar pra câmera é olhar para você mesmo”. 

fechar