Depois do frio, da fome e do medo, uma cama

por Noor Shakouj

No segundo dia de sua jornada, Noor consegue chegar a Edirne, cidade turca na fronteira com a Grécia

Dia 2 – 16 de setembro de 2015

"Acordei em uma barraca na beira da estrada. Não tinha água. Não tinha comida. A noite foi gelada. Pensei em voltar alguns quilômetros e comprar mantimentos. A situação está mais complicada do que imaginei. A polícia fechou a passagem que levaria até a fronteira. Precisei escapar da estrada principal, pegar um caminho secundário. Não sabia o que ia acontecer. Caso nos descobrissem em um caminho alternativo, corríamos o risco de ter que pagar cerca de 500 liras (quase 700 reais) por um esquema ainda mais ilegal – sim, a polícia turca cobra propina para facilitar nossa vida. Não vi isso acontecer, não paguei, mas me passaram esse alerta no caminho. 

Não tinha pensado que seria tão difícil chegar até aqui. Nossa ideia é nos reunirmos em um único ponto para facilitar a passagem pela fronteira. A polícia turca sabe disso e não quer deixar que a gente ande junto. Se tivermos sucesso, seremos mais de 5 mil pessoas cruzando para a Grécia. Há entre seis e sete pontos que concentram os sírios neste trajeto. Chamamos de pontos de protesto, mas não há protesto, não estamos gritando, não temos cartazes. Só estamos tentando nos unir para seguir juntos. Há quatro barreiras policiais. Em todas elas, os sírios são impedidos de avançar. As pessoas vão ficando na estrada, fazendo seus acampamentos sem saber o que fazer. 

Estou muito decepcionada. As decisões têm sido frustrantes. Passamos o dia sem nenhuma comida. E só conseguia pensar em comer. Por volta das 16h, com estômago ainda vazio, conseguimos uma carona de ônibus. Foi nossa salvação. O motorista foi solidário. Conhecia bem a estrada, fez caminhos alternativos e finalmente chegamos a Edirne.

Esta noite vamos pegar um quarto em um albergue – o lugar não é muito bom, mas é barato. Não vamos ao ponto de concentração hoje porque não queremos arriscar nossa chance. São 18h. Até amanhã vamos ficar esperando por notícias mais certas. O irmão de Diala está para vir, apenas esperando o ponto certo onde possa nos encontrar. Precisamos esperá-lo. Estou com muito medo, me deseje sorte. Mas estou muito feliz por ter uma cama esta noite."

ANTES. Dia 1: Noor é síria, tem 19 anos, e acaba de sair da Turquia rumo ao sonho de um país para chamar de seu. Conheça a história.

DEPOIS. Dia 5 e 6: Com medo e impressionada com a situação vivida nos últimos dias, Noor está cheia de dúvidas. Mais uma vez, precisa tomar uma decisão. Seguir em Istambul, como imigrante ilegal, ou ir de em busca do sonho de chegar a Alemanha? Tempo de pensar.

 

 

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