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Que bom! André Marques, que fez o Mocotó...

Apresentador vive uma nova fase depois de uma cirurgia de redução do estômago e conversa sobre peso, bullying, paixão pela música e recomeço

A última atualização de André Marques no Soundcloud — site que usa para divulgar seu trabalho como DJ —, há um ano, foi um set de deep e tech house, mixado em novembro de 2013. O clima das músicas, e da vida de Marques, é como diz o título escolhido para o set: "Rebirth", ou renascimento, em inglês. Naquele mesmo mês, o apresentador havia se afastado do Vídeo show, programa em que esteve por quase 14 anos, para fazer uma cirurgia de redução do estômago — e ficou fora da televisão por cinco meses.

Quando voltou, em abril de 2014, para apresentar o concurso de bandas SuperStar, já tinha perdido 50 dos 160 quilos que pesava antes. "Foi irado, porque eu voltei a trabalhar, que eu adoro, e encontrei com todo mundo, e as pessoas que se preocupavam com a minha saúde ficaram megafelizes porque viram que eu estava mais magro."

Peso é passado
A mudança estética também é visível: aos 35 anos, Marques está com 85 quilos, o mesmo que pesava quando ainda era o adolescente Mocotó, em Malhação. São 75 quilos a menos, e Marques já exibe resultados dos exercícios que passou a fazer (pratica stand up paddle e vai para a academia, embora não curta muito o clima de malhação, "vou porque tem que ir, acho horroroso").

"Tô ouvindo umas agora, 'tá magro demais', 'tá ficando com cara de doente', aí eu rio", diz. "E tem gente que fala 'operando o estômago é mole'. A pessoa que faz um comentário desses é imbecil. Adoraria ter emagrecido sem ter que fazer cirurgia, tentei oito anos e nada."

Optar por uma intervenção cirúrgica não pareceu uma decisão fácil ou óbvia para Marques. "Começou a atrapalhar minha qualidade de vida. Tipo, meu quarto é no segundo andar e se eu esquecesse o celular falava 'putz, não vou subir as escadas de novo para pegar o celular'. Eu ficava ofegante, suava gelado." Ele também já não conseguia mais nem brincar com suas cachorras. São quatro, com 50 quilos cada uma, alimentadas com comida orgânica, e quando ia brincar de lutar com elas ficava sem ar, achando que ia ter um enfarte. O médico foi claro: Marques era uma bomba-relógio. Perguntando sobre a possibilidade de morrer na operação do estômago, ouviu que era mais provável que morresse de alguma doença relacionada à obesidade. Ele estava, por conta do excesso de peso, com diabetes, e já enxergando um pouco embaçado (a diabetes pode causar cegueira).

Mas Marques, apesar de dizer que os ganhos foram maiores que as perdas, não quer ser visto como garoto- propaganda da redução de estômago. "Eu não faço apologia da cirurgia. Qualquer coisa que você perguntar, que você falar, eu já fiz. Spa, dieta de copo d'água embaixo da pia, um dia só ovo, um dia só brócolis, lipo e o cacete a quatro, mas o importante é cuidar da cabeça", diz.

De mão cheia
Olhando a forma dedicada e um tanto obsessiva com que André Marques trata os temas pelos quais se interessa, é fácil acreditar que ele tenha mesmo tentado de tudo. Um deles é a culinária, que já vem desde a infância na fazenda do pai, criador de gado leiteiro no interior do Rio de Janeiro. "Meu pai sempre gostou de fartura, fazer um porco enterrado, um boi no rolete", conta.

O gosto por cozinhar é tanto que, no ano passado, Marques venceu um concurso culinário apresentado por Ana Maria Braga em seu programa matutino, Mais você, o "Super Chef Celebridades" — garantindo na final o voto do público e de quatro dos cinco dos jurados, incluindo o do famoso chef e sushiman Jun Sakamoto.

Só recentemente, entretanto, depois da cirurgia, é que Maques passou a usar os seus conhecimentos culinários para cozinhar para ele mesmo, antes, "qualquer macarrão instantâneo tava valendo", diz.

A parte boa mesmo de cozinhar, para Maques, é "o prazer de servir e agradar as pessoas". Na fazenda, conta, faz sozinho uma paella de fim de ano para os pais e os funcionários, 150 pes­soas. Em casa, adora cozinhar para os amigos.

Vacas gordas
Da cozinha vem um outro assunto que muito interessa Marques: carnes. Quando se mudou de Niterói para a Barra da Tijuca, para ficar mais perto do Projac, ele, fã da raça japonesa de gado Wagyu, não encontrou nos supermercados do novo bairro "uma carne gourmet, uma carne bacana" que lhe agradasse. Inspirado por um amigo de Niterói que já tinha uma loja de carnes de luxo, resolveu estudar o tema: foi conhecer Kobe, no Japão, terra dos Wagyus, pesquisou o mercado, falou com o pai, com os amigos que criam gado de corte.

Assim, em 2013, inaugurou a butique de carnes Prime, em sociedade com o marido da sua empresária. O sucesso é tanto que a loja vai ganhar uma filial no Leblon e mais cinco endereços pelo Brasil até o fim de 2016. Orgulhoso de ser pioneiro na venda de kobe beef no varejo no Rio, Marques também costuma passar um tempo na Prime vendendo carnes. "Nego não acredita. Vejo as pessoas falando: 'Caralho, achei que você era tipo um garoto-propaganda, contratado'", conta. "Também vão os caras que criam gado, e começam a me testar, fazer um monte de pergunta sobre corte, abate humanitário, e eu vou e blau. Eles falam: 'É rapaz, estudou bem, né? Achei que era tudo migué esse negócio seu com as carnes'."

Eu, André Marques, DJ
É a música, entretanto, o grande hobby, paixão, terapia, de André Marques. O André Marques DJ nasceu, em parte, depois de uma viagem de última hora do apresentador a Ibiza, em 2007, por um motivo inusitado: acompanhar um amigo que queria pedir uma amiga em casamento. Desde então, Marques volta todos os anos ao arquipélago espanhol, "berço da boa música" — chegou a ir quatro vezes na mesma temporada, e sonha em ter uma casa lá depois da aposentadoria para passar o verão inteiro "andando na praia só de miçanga".

"Em Ibiza eu aprendi essa parada do respeito", diz. "Ninguém julga se a mulher passa no meio da boate, se o cara tá de tanga, se tem estria, celulite, se o cara tá gordo, se tá magro. Nego tá lá pra se divertir. Nego tá lá pra idolatrar a grande estrela que é a música."

Marques comprou os equipamentos de DJ e descobriu que mixar não era tão simples. "Pensei 'putz, impossível essa porra'. Só que eu sou vaidoso, e queria aprender." Assim, chamou o DJ Wally Iglesias para morar na sua casa, ainda em Niterói, e passou um ano tendo aulas. No começo, tocavam juntos, no duo UP Music, Unidos Pela Música. Depois que Marques pegou confiança e se sentiu confortável, passou a se apresentar sozinho.

A música que ele toca é house, mas as minúcias estilísticas de Marques mudaram bastante. Ele começou tocando um som mais acessível, mas nos últimos anos se "apaixonou pelas músicas mais cabeçudas" e enveredou para o underground, do deep e tech house. "Tocar pra cem pessoas que estão ali para curtir o teu som é mais importante que tocar para mil que não estão entendendo nada. Por isso, recuso tocar em festivais de pagode, axé, funk", explica. "Se eu tocasse um som pop, de rádio, dava para misturar, mas o som que eu toco não dá."

Que bom!
Bullying e preconceito são coisas que André Marques sentiu com força, principalmente depois que engordou. "Sofri, mas sou forte, e já vi muita gente que me zoava passar vergonha", conta. "Sou bem resolvido, e na Globo nunca houve imposição de padrão de beleza, pedidos para emagrecer, nada", diz. "Fiquei oito anos gordo apresentando o Video show."

Depois da obesidade, o emagrecimento de Marques também foi motivo de piada — mas ele diz se divertir com a maior parte dos comentários. "Eu levo de boa, tem umas que eu rio, tem umas que eu falo: 'Putz, esse neguinho é muito babaca'", conta. "Lido bem porque eu mesmo me zoava, falava sou o gordinho mais bonitinho daqui etc."

Um dos bullyings mais famosos é o do vídeo "André Marques que fez o mocotó! Que bom!", de 2013, uma paródia de "Don't stop til you get enough", de Michael Jackson, que fez amplo sucesso na internet. "Esse, por exemplo, quando me mandaram, um amigo falou 'André, fizeram um vídeo te zoando, você vai ficar puto'", conta. "Eu não fiquei puto nem nada, achei um vídeo trash, tem um quê de engraçado, tem um quê de má informação, porque a música fala que eu nunca fiz filme, e eu já fiz filme!", ri (Marques fez dois filmes, Xuxa em o mistério de Feiurinha, de 2009, e Um show de verão, de 2004). "Mas não achei uma parada agressiva. Não teve nada que me deixou puto, nada que me incomodasse a ponto de, sei lá, querer processar", afirma.

Mocotó eterno
Mocotó, claro, está presente na vida de Marques, ainda hoje. Mais em 2015, quando a primeira temporada de Malhação completa 20 anos. "Eu sei que é tempo pra cacete, mas ao mesmo tempo eu lembro de detalhes como se fosse ontem", conta. Há duas décadas, nem o Projac existia: as gravações eram no Cinédia, estúdio de 1930, no bairro carioca da Taquara, e que hoje virou um condomínio.

Antes de se tornar o Mocotó, Marques estudava teatro no colégio, em Niterói. Um amigo da mãe (que era diretora de ala da Imperatiz Leopoldinense), Ilclemar Nunes, jurado do Carnaval carioca no quesito mestre-sala e porta-bandeira há 30 anos e professor de teatro, conheceu o jovem Marques no barracão da escola de samba e o chamou para participar da peça Os sinos da Candelária, sobre a chacina de meninos de rua no centro do Rio pela polícia.

Em um curso de teatro, ficou sabendo dos testes para Malhação. "A gravação era à 1 da tarde, porque tinha um monte de menor de idade", conta. "Eu estudava de manhã em Niterói, gravava até 21 horas, que é o horário da lei pra trabalhar, e depois iam levar todo mundo em casa. Eu era de Niterói, o último, né? Chegava meia-noite e pouco, tinha que contar pra mãe tudo o que aconteceu, dormia às 3 da manhã. Mas era divertido."

Marques, hoje, não se importa em ter ficado marcado como Mocotó. "Eu ouvi pra cacete isso na época, de que ia ficar marcado como Mocotó. Eu tinha essa preocupação", diz. "Tem uma porrada de gente que ainda me chama de Mocotó. Eu acho irado. A galera pergunta: 'Pô você não fica puto?'. Eu falo: 'Porra, se tá na lembrança de todo mundo que comenta então é lembrança de coisas boas'."

Ex-magro, ex-gordo
Voltar a atuar não é uma vontade de André Marques, porém. A ideia é continuar a carreira de apresentador inciada depois de Malhação. "Apresentar programa foi onde eu me encontrei", resume. "Mas sou empregado padrão, né? Se falarem que é para eu fazer..." Já o palco é outra história. Em 2016, Marques quer trabalhar no projeto de uma peça de teatro.

Sobre relacionamentos, ele não gosta de comentar muito, mas afirma que o coração "tá bem, tá bombando". Já sobre sexo, o "único esporte" que praticava quando ainda estava obeso, diz que está bem melhor. "Pega 75 quilos e levanta, amarra nas costas e tenta dar umazinha pra ver se vai ser maneiro", ri. Mas o que ele não minimiza é a importância de ter emagrecido, que ele encara como um retorno. "Na verdade, sou um ex-magro, que fiquei gordo, e fiquei magro de novo", diz. "Hoje me sinto normal, em fazer coisas que eu não estava fazendo porque a obesidade não deixava." E resume o novo momento: "Estou mais feliz, mais bonito. Tem a felicidade de não estar fodido de saúde, achando que posso morrer a qualquer momento". Que bom!

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