A marca do jorro

por Mariana Caldas
Trip #195

Ejaculação feminina: a real do fenômeno que intriga homens e mulheres

Ela estava sentada em cima dele quando gozou. Foi tão intenso que hoje, oito anos depois, ela quase consegue sentir, mas não descrever. Ele sentiu um líquido quente escorrendo pelas pernas, ficou literalmente encharcado. Mônica e Franco eram só amigos, até que sentiram a energia sexual que tinham um pelo outro. “Rolava uma química absurda, a mesma frequência, o mesmo ritmo. Era uma coisa meio ‘encostou, rolou’”, relembra Mônica. Ele também ficou marcado. “Ficávamos três, quatro horas trancados no quarto. Era muito intenso.” Naquele dia, Mônica ejaculou. Mas só percebeu que estava tudo molhado depois. Os dois perceberam que tinha acontecido algo especial. Não conseguiam parar de rir.

Mônica só ejaculou mais uma vez, pouco tempo depois, com Franco de novo. “As preliminares foram longas. Ele me apalpou e fez carícias onde, para mim, só pode ser o ponto G”, conta ela, que sempre faz questão de mostrar onde e o que gosta na hora do sexo. “Acho que não rolou mais porque existe um desconhecimento geral dos homens e das mulheres em relação ao próprio corpo. Quando contei nenhuma das minhas amigas sabia nada a respeito”. Ela completa: “Outro dia vi a sexóloga do Altas horas [Laura Muller] falando que ejaculação feminina era lenda, que não passava de uma lubrificação mais intensa. O que eu tive não foi só lubrificação, ficou uma poça na cama. Fiquei até ofendida.”

Eduarda também passou por uma situação parecida. Ela tinha 23 anos quando ejaculou pela primeira vez. Ficou sem entender, achou que poderia ter tido incontinência urinária, mas o líquido não tinha cheiro, nem cor. “Tinha tido um orgasmo diferente, bem gostoso e superpotencializado.” Depois foi pesquisar, mas não encontrou muitos relatos. “Vi muito médico dizendo que era viagem, invenção de mulher histérica. Uma vez um ginecologista chegou ao ponto de me dizer para não comentar com as pessoas. Me senti um alien. Mas depois percebi que ter esse tipo de prazer é um privilégio.” Hoje suas ejaculações são frequentes. “É como se um canal tivesse se aberto. Mas é preciso muita confiança, entrega e bastante tempo. Se o cara pegar no clitóris e no ponto G ao mesmo tempo, pra mim é fatal”, explica. Seu atual namorado, Paulo, concorda. “Acho que é mais fruto de uma relação feita com entrega física e espiritual do que propriamente do uso de técnicas. Mais importante do que encontrar ou não o ponto é saber o que fazer com ele.”

Rainha do squirt

Nos últimos anos a ejaculação feminina tornou-se fenômeno do mercado pornográfico. Ganhou seu espaço como um dos inúmeros subgêneros do rala e rola: squirt (“jorro” em inglês). Sua estrela maior é a atriz pornô norte-americana Cytherea, que tem performance impressionante no quesito, mas várias outras exibem esse “dom”.

Para entender melhor essa história, fomos atrás de mulheres comuns que ejaculam e falamos também com sexólogos, terapeutas e ginecologistas. Como a ejaculação ainda é tabu para muitos, as mulheres falaram abertamente sobre o assunto, mas preferiram não tirar fotos nem revelar seus sobrenomes.

“Não aprendemos isso na faculdade, também não se fala disso na maioria dos consultórios”, explica o ginecologista e obstetra Jorge Kuhn. “Mas basta ter um pouquinho de humildade, visão aberta e deixar a mulher falar. Às vezes elas comentam com amigas que nunca ouviram falar disso, e se sentem diferentes. A ejaculação foi motivo da primeira consulta de muitas pacientes minhas.”

Kuhn explica que o “sêmen” feminino vem das chamadas glândulas de Skene, à esquerda e à direita da uretra. O líquido jorrado é pouco viscoso, não tem cheiro nem cor. Não é nada parecido com a urina ou a lubrificação, que vem das glândulas de Bartholin, na entrada da vagina. A maioria dos pesquisadores e educadores sexuais acredita que a ejaculação acontece com a estimulação do ponto G, tecido glandular esponjoso que pode ser sentido através das paredes da vagina. O famoso ponto é análogo à próstata masculina, se origina do mesmo tecido embrionário e, segundo Mantak Chia e Rachel Carlton Abrams, autores do livro taoísta O orgasmo múltiplo da mulher, é o “disparador” do líquido, que conteria substâncias químicas idênticas às presentes no sêmen masculino – menos, claro, os espermatozoides.

A sexóloga Glene Rodrigues explica que nem todas as mulheres podem “esguichar” dessa forma. “Estudos não científicos mostram que a maioria das mulheres teria essas glândulas fechadas e, por isso, não seria capaz de ejacular. Cientistas americanos acreditam que só 30% teriam esses condutos abertos.” Glene, no entanto, faz uma ressalva sobre a supervalorização da ejaculação feminina. “É muito importante ressaltar que a ejaculação não precisa acontecer para que o orgasmo seja intenso. O que importa é se descobrir, achar um parceiro que a estimule, para assim encontrar o seu potencial.” Procurada pela reportagem, a sexóloga do Altas horas, Laura Muller, foi cuidadosa: “Ainda não existe consenso entre os sexólogos sobre a capacidade das mulheres de ejacular. Porém alguns pesquisadores estão começando a dizer que elas podem sim soltar pequenos jatos – e não rios como se veem nos filmes pornôs. E não podemos nunca esquecer que o orgasmo não depende desses líquidos”.

Gabriel Saananda, terapeuta tântrico, dono do centro Cia. do Ser, explica que quando uma paciente chega à ejaculação durante uma sessão é porque teve um orgasmo “absurdo” e estava absolutamente confiante. Tatiana Ito, também terapeuta tântrica, joga um ingrediente místico na discussão. “É um líquido que não sai de dentro, ele vem da alma. Nenhuma mulher vai pesar menos depois.” Ela se baseia em relatos de mulheres que, depois de ejacularem 2 litros (sim, 2 litros) em sessões contínuas de massagem, só perderam 200 gramas.

“Tive um relacionamento de nove anos no qual eu não tinha prazer, era tudo meio seco. Há três meses conheci meu atual namorado e foi muito forte. Na segunda vez que a gente transou eu ejaculei. Fiquei assustada, não senti um jato, foi como se estivesse fazendo xixi. Mas foi uma sensação muito intensa, de êxtase, meu corpo vibrava. Agora é muito recorrente, 80% das vezes acontece. A melhor posição é de quatro. Outra coisa importante é que ele demora pra gozar, se preocupa muito com o meu prazer. E, outra coisa, no último ano emagreci 22 kg, hoje estou muito satisfeita com meu corpo, e isso também influenciou.”
Natália, 29 anos, historiadora e pesquisadora

“Eu devia ter uns 21, 22 anos quando aconteceu. Foi com o meu namorado, a gente estava se descobrindo, acho que foi de tanto praticar. Tenho muita facilidade pra gozar. Se o pênis for grande então, é muito rápido. Rolou três vezes com ele depois, e eu estava sempre por cima. Eu gozei, ele continuou a penetração, e aí ejaculei. Foi um prazer contínuo, como se o orgasmo não acabasse. Fiquei fora do ar, mole, minha perna não parava de tremer. Depois tive mais duas vezes, com dois caras diferentes. Não tenho pudor na hora do sexo, tudo é excitante, e eu fico muito lubrificada. Gosto muito da penetração e, na maioria das vezes, tenho orgasmos múltiplos, principalmente quando estou de quatro, mas depende do tamanho do pau. Pra mim, o ideal são uns 22 cm.”
Liege, 48 anos, gerente de pousada

“Sou virgem, mas no fim do ano passado ejaculei enquanto dava uns amassos com meu ficante no sofá. Não éramos namorados assumidos, mas nosso caso era sério e por isso tínhamos muita intimidade, sempre confiei muito nele. Eu estava super-relaxada e pra mim foi o maior privilégio, todas as minhas amigas sempre falam como é difícil gozar, e eu ejaculei no primeiro orgasmo da minha vida. Foi uma sensação ao mesmo tempo muito boa e muito estranha. Mas pensei: isso está muito bom pra ser alguma coisa errada. Senti uma pressão muito grande, como se uma bomba estourasse, minha perna adormeceu e começou a tremer. Não tenho uma relação muito boa com meu corpo, acho meu peito pequeno, minha bunda grande, a barriga gordinha, mas percebi que ele gostava de mim do jeito que eu era e desencanei.”
Débora, 20 anos, estudante de administração

“Tinha 17 anos quando rolou. Foi com um cara que mexia muito comigo. Estávamos no carro e começaram uns amassos. De repente, saiu um jato, como se fosse um xixi, e o banco ficou completamente molhado. Fiquei constrangida, eu era muito nova, não sabia o que era aquilo. Mas ele foi fofo. Depois aconteceu de novo com um ex-namorado, com quem eu tinha muita intimidade. Agora acontece com frequência com o meu atual, tanto nas preliminares como na penetração. Pra mim, a melhor posição é quando estou sentada por cima e junto com a penetração ele estimula meu clitóris. Ele adora quando acontece e às vezes fica achando que, só porque eu não ejaculei, não gozei. Não é nada disso, na maioria das vezes eu chego ao orgasmo, tenho facilidade. A minha relação com meu corpo é muito boa. Na hora do sexo, só penso no sexo.”
Gabriela, 21 anos, estudante de jornalismo

“Há um ano e meio eu tive uma ejaculação com um ficante, na primeira vez em que transamos. Rolou uma superintimidade e foi uma sensação maravilhosa, um orgasmo completamente diferente, uma experiência mística. Foi uma explosão, como se estivesse baixando o nível da água de um reservatório. Ele estava fazendo um fisting, técnica dos adeptos do fetiche, com as mãos, e eu fui dizendo para ele fazer uma compressão na região entre o umbigo e o começo da vagina, ao mesmo tempo que me penetrava com os cinco dedos e quase a mão toda. O resultado foi um squirt. Eu já tinha maturidade para saber do que se tratava e ele também. Não passo vontade, não dependo de homens para sentir prazer, já cheguei a me masturbar por quatro horas seguidas sem parar. Sinto que há um ponto muito erógeno no meu corpo que descobri há dez anos, quando tive um rolo com um europeu 17 anos mais velho. Ele era adepto do tantra e com ele descobri esse ponto, entre o umbigo e a vagina.”
Malu, 36 anos, designer de lingeries

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