Além da Casa do Saber

por Natasha Madov
Trip #169

Empresário cria ONG Parceiros da Educação para levar o mundo empresarial ao ensino público

Em 2004, a Escola Estadual Luis Gonzaga Travassos da Rosa, no Jardim Morumbi, em São Paulo, passava por uma fase difícil: pichações, falta de água, carteiras e lousas danificadas, professores desmotivados, aproveitamento escolar baixo.

Ao mesmo tempo, o empresário Jair Ribeiro aproveitava na cidade um período sabático após encerrar uma bem-sucedida carreira de banqueiro, que incluiu a diretoria do JP Morgan, em Nova York. Ins­pirado pela adoção de algumas escolas públicas na favela de Paraisópolis pela seguradora Porto Seguro, ele procurava uma instituição para experimentar um projeto parecido.

O encontro entre essas duas realidades foi a semente que gerou a Parceiros da Educação, uma ONG que se dedica a reunir escolas estaduais com empresários dispostos a patrociná-las para melhorar o rendimento escolar dos alunos da rede pública.

É um investimento lento, mas que traz dividendos seguros. No caso da Travassos (como é conhecida), quatro anos depois, o que se vê é uma escola bem-arrumada, salas de aula pintadas em cores alegres (esco­lhidas pelos alunos), serviço de limpeza terceirizado e uma quadra de esportes que é o orgulho do bairro. Mais escondidos, porém ainda mais importantes, estão os indicadores educacionais: o número de analfabetos funcionais da 5ª à 8ª série, que passava de 100, zerou; a rotatividade de professores diminuiu sensivelmente e, em avaliações padronizadas, o conhecimento dos alunos em leitura e escrita aumentou 19% e em matemática 15%, em média. “A escola agora está um encanto. Ela passou a ser importante para alunos e professores, não temos mais problemas de disciplina”, relata o coordenador pedagógico Celso Renato Teixeira.

Casamento feliz
A partir da idéia de Ribeiro, a iniciativa chegou a 65 escolas do Estado, com cerca de 80 mil alunos atendidos. Os custos, em média, são R$ 100 por aluno ao ano. “Mas dinheiro não é tudo, é fundamental a participação efetiva do empresário”, diz André Drexler, coordenador administrativo da Parceiros.
O trabalho começa na identificação de escolas e empresários, no “casamento” entre os dois, e, depois, no diagnóstico das necessidades de cada escola. “São quatro frentes: a estrutura física da escola, se ela precisa de uma reforma, como estão seus equipamentos; a gestão, como ela está sendo administrada; a parte pedagógica, como capacitação do corpo docente; e, finalmente, o envolvimento com a comunidade do entorno”, descreve Ana Maria Diniz, acionista do Grupo Pão de Açúcar, que capitaneia a ONG com Ribeiro.

É essa análise das necessidades da escola que faz o investimento do empresário, normalmente da ordem de 10% do valor investido pelo Estado, fazer tanta diferença nos seus indicadores. “O governo de São Paulo tem 5.300 escolas; não há como tomar decisões baseadas no que cada uma precisa”, diz a coordenadora Lúcia Fávero. “O que a parceria faz é focar em coisas mais específicas, como a formação continuada dos professores, por exemplo. Nesse sentido, a parceria otimiza o que o Estado já disponibiliza.”

Mas um denominador comum em todas as escolas se faz presente: um profissional chamado de “facilitador”, cuja função é intermediar o discurso de negócios, metas e resultados do empresário com o mundo da educação pública, onde os processos
são mais lentos e institucionalizados.

E, em todas, existe uma figura a ser ganha: a da temível diretora. “A diretora precisa
ser conquistada, sem ela o processo não anda. Aliás, tudo numa escola pública, cada avanço, é uma conquista. O empresário precisa saber disso, entender essa realidade”, explica Ana Maria.

A Parceiros da Educação tem um irmão gêmeo curioso, nascido ao mesmo tempo e fruto do mesmo sabático de Jair Ribeiro: a Casa do Saber, centro cultural que oferece cursos livres e palestras sobre várias áreas do conhecimento, freqüentado pela classe alta e média alta de São Paulo e Rio de Janeiro. A idéia surgiu porque Ribeiro começou a juntar amigos em sua casa para discutir temas de filosofia, analisar filmes e peças, mediados por professores universitários. As reuniões ficaram tão populares que ele logo viu uma oportunidade de negócios, e assim nasceu a Casa. Como a Parceiros, ela é um negócio de estimação do empresário.

“No caso da ONG, trata-se de uma obrigação minha, que é devolver algo à comunidade. Como considero que o maior problema do Brasil é a educação, é nisso que quero investir. Já a Casa do Saber é um hobby, por assim dizer. Com ela eu ajudo as pessoas a terem uma vida mais completa, a maximizar seu potencial”, diz.

Fã do filósofo Baruch Spinoza, o Jair Ribeiro pessoa jurídica é CEO da CPM Braxis, uma empresa de serviços de tecnologia de informação criada durante uma viagem à Índia. Em dois anos de existência, já é a maior de seu setor no país, com 5.400 funcionários, 200 clientes e 14 centros de desenvolvimento de software. Faturou R$ 1 bilhão no ano passado, já passou por três fusões e tem entre seus sócios pesos pesados como Bradesco e Gávea Investimentos.

Se os negócios da CPM Braxis crescem nesse ritmo praticamente exponencial, Ribeiro não deixou por menos: a meta da Parceiros para este ano é chegar a 100 escolas adotadas por empresários, e até 2010, a 500. A educação pública agradece.

 

fechar