por Flora Paul

A escritora pulp Ana Paula Maia fala de suas novelas políticas e violentas ao site da Trip

A literatura de Ana Paula Maia é feita para quem gosta de carne. Mas muita calma, leitor da Trip: não é no sentido figurado. Ana Paula escreve sobre carne, músculos, sangue, violência, crueldade e crueza: é o que chama de literatura pulp.

Com 31 anos, foi a primeira autora brasileira a ter uma novela escrita para a internet transformada em livro impresso. Entre rinhas e porcos abatidos reúne duas novelas – a do título, que foi publicada na internet em 12 capítulos – e O trabalho sujo dos outros. As duas fazem parte do que a autora chama de A Saga dos Brutos, trilogia que retrata o mundo de pessoas underground com trabalhos que poucos aceitariam e que sobrevivem da miséria.

Quando pequena, Ana queria ser médica. “Apesar de ter me afastado da ideia na adolescência, acho que o interesse pela dissecação permaneceu. Eu não queria dissecar corpos, mas dissecar camadas do espírito e sondar seus entendimentos”, explica. Acabou se tornando escritora e se dedica completamente à literatura, fazendo no máximo frilas de redação. Enquanto tenta concluir a parte final da saga, Ana falou ao site da Trip, por e-mail, sobre o que é a literatura pulp, suas inspirações e outros bons autores “de internet”.

Como você começou a escrever? Quando percebeu que seria escritora?
Comecei a escrever há dez anos, por inquietação, eu acho. Escrevia de modo segregado. Só pra mim. Mas percebia, ainda no início, que eu viveria uma vida paralela com as minhas histórias e que isso me daria um sentido especial para seguir adiante. Percebi que seria escritora após publicar meu primeiro romance e de ter participado de algumas antologias.

Quais são suas inspirações?
A minha principal inspiração é o mundo real e suas deformidades. Nas artes, a literatura de Campos de Carvalho, a música de Johnny Cash e os filmes de Sergio Leone.

Você se autodenomina uma escritora pulp. O que você considera pulp? Você não acha que, de alguma forma, sua escrita pode acabar limitada dentro de uma categoria?

A minha literatura é pulp no sentido que estabeleci para ela. Sabemos que pulp é polpa. É na polpa, na carne musculosa, na importância e substância, na parte carnosa do fruto que está fincado o mundo das ideias do meu texto. O universo que tenho criado é recheado de uma espécie de polpa que mistura o valor humano, a condição do homem, a imposição do trabalho, a brutalidade, as limitações, a resignação e as várias possibilidades de investigação da alma. Eu dei um outro sentido ao termo. Dei a ele o meu sentido.
 
Você teve umas primeiras novelas de internet transformadas em livro por uma grande editora. Como isso aconteceu?
Queria esclarecer um detalhe importante: internet não é gênero, internet é veículo, não existe conto ou novela ou romance ou crônica de internet. Escrevi um conto por encomenda que foi publicado numa antologia italiana em 2005 pela editora Mondadori. O conto pedia uma continuação e segui escrevendo a história, que se transformou numa novela. Quando tinha essa novela quase completa, publiquei na internet em 12 semanas (um capítulo por semana) com uma edição especial, com cortes específicos para serem lidos no formato folhetinesco. Repeti o que alguns escritores do século XIX fizeram. Eles publicavam seus romances em formato de folhetim em rodapés de jornais, de modo fragmentado, e, se o público gostasse, essa história era publicada em livro. Substituí o papel do jornal pela tela do computador. Não inventei nada. Foi um experimento baseado em dois séculos passados.

Como você acha que a internet pode mudar a literatura?
Espero que a internet nunca mude a literatura. Ela é perfeita como é. Ela pode difundir a literatura, chamar a atenção para novos leitores, sobre novos livros e novos e antigos escritores. A internet já tem exercido um papel fundamental na disseminação da literatura no mundo. É um excelente veículo de propagação do que quer que seja.
 
Seus personagens são underground. Você acha que essas pessoas escreveriam contos?
Meus personagens, alguns deles, são semianalfabetos. Quando não são por completo. Eu escrevo por eles, sobre eles.
 
Você se considera um escritora politizada?

Sim. Eu sou uma escritora politizada. Isso tem se tornado evidente pelo texto que escrevo.
Essa política é referente ao trato das relações humanas existentes no universo em que as histórias estão estabelecidas. Evidentemente não me abstenho de uma posição ideológica a respeito do Estado e consequentemente entende-se aqui pelo modo de nós existirmos na sociedade e sermos conduzidas nela. As minhas histórias manejam um paralelo entre o real e as possibilidades extremas desse real. São simulacros que evocam situações possíveis e que nos dão chance de meditar.

Qual é sua intenção com a literatura?
A minha intenção com a literatura é fazer minha política e estabelecer através da ficção uma série de códigos de ética, de conduta e investigação. Acho que a literatura tem algumas funções importantes como o autoconhecimento e a especulação do espírito humano. E é sobre esses dois alicerces que construo minha ficção.

Que outros escritores “de internet” você indica?
Bons escritores que têm blogs eu indico Santiago Nazarian, Márcia Bechara, Manoela Sawitzki, Andrea Del Fuego, Índigo, Xico Sá, Cláudia Lages, entre outros. E indico o Fabiano Vianna, criador de uma incrível transposição de fotonovelas para a internet.

Quais são seus próximos planos?
Concluir a trilogia A Saga dos Brutos, já que as duas primeiras partes acabam de chegar às livrarias no livro Entre rinhas de cachorros e porcos abatidos. Esse livro possui uma novela que dá título ao livro e outra que se chama O trabalho sujo dos outros. A terceira parte da trilogia ainda e inédita. Pretendo publicá-la quando estiver pronta.

 

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