Coragem, Alienação ou Covardia?

por Luiz Alberto Mendes

 

Recentemente fui chamado para um bate-papo, com alunos de uma das salas do curso de Direito da PUC/SP. Fora convidado pelo professor Gustavo Junqueira, que me convoca todos os anos para conversar com seus novos alunos. E dessa vez ele me avisou que iria um amigo dele, assistente social, que estava interessado em me conhecer porque estava fazendo uma pesquisa com egressos da prisão. Isso muito me interessou. Tenho compromissos sérios com esse meu povo e sempre que for possível e justo, eu os apoiarei.

Nem percebi quem era a pessoa, conversei bastante, mais de duas horas. Foi bem legal, os estudantes fizeram perguntas instigantes e bastante pertinentes. Gosto muito de conversar, é um dos maiores prazeres de minha vida. Particularmente com estudantes, eles são que o oxigênio da vida. Alias, me decidi por ser escritor um pouco por conta disso. Ninguém me aguenta falando, falo muito, viajo nas idéias. Dai escrevo, onde viajo também, mas nem tanto, como podem notar.

Acabada a "palestra", o pessoal aplaudiu de pé e pareceu gostar muito. Vendi muitos livros e fomos saído da sala, fui quando o Professor Gustavo me apresentou Bruno, o Assistente Social. Trocamos cartões e ficamos de nos comunicar por e-mail. Dias depois recebi seu e-mail. O rapaz esta para defender tese de doutorado e precisava conversar comigo alguns assuntos da tese. O tema dele tinha a ver com o que afirmo sempre sobre a questão do egresso. Não há uma lei única que proteja os homens que saem das masmorras do Estado. Acabada a pena o sujeito é jogado na rua com um pé na bunda e um sonoro: te viraaaa... E que ai esta a razão de ser 75% o índice de reincidência no Estado. De cada quatro que saem, três voltam, apenas um fica. E se esse um for morto, não ficou nenhum. O preso esta condenado a voltar para a prisão antes de sair; a outra opção é morrer. Uma tragédia social que ninguém se dá conta.

Ele havia descoberto egressos de prisão vivendo entre os mendigos na rua. Tenho um parceiro que entrou nessa "onda" e desapareceu, sumiu, jamais se ouviu falar novamente. E se espantou quando percebeu que eram muitos, inúmeros. Começou a pesquisar, falar com eles e sua tese era relativa a esse desamparo, esse abandono. Eu sempre soube e já encontrei alguns ex-companheiros mendigando, tentei ajudar, mas eles só queriam dinheiro, e isso não tenho, mas dei o que pude. Tinha vergonha de mim, se escondiam quando me viam. Eles achavam que eu era um malandro/escritor de sucesso e que ganhava muito dinheiro e eles, puxa, haviam perdido tudo. Mas agora, diante muitos, imediatamente me veio em mente tentar criar uma ONG para protegê-los. Conversei com o Bruno e estou esperando uma resposta dele.

Mas fiquei pensando. Caramba! Seria mais fácil para eles roubarem alguém, serem presos e voltar para a prisão. Lá, com um pouco de sorte, poderiam conseguir uma cama, uniforme limpo para vestir, cobertor, alimentação que não é lá essas coisas, mas quente e forra o estômago. Porque eles insistiam em dormir ao relento, no chão duro, frio e comer resto dos outros no lixo dos restaurantes? Doentes, velhos, sem sentido algum de viver e nada que lhes levante o moral, profundamente solitários (devem chorar por dentro quando desabam), pessoas apagadas e ali jogadas no chão. Seria o sentimento de liberdade? Seria para não ferir mais ninguém (um homem se cansa disso)? Ou simplesmente alienação, uma fuga da realidade?

Estou tão curioso que assim que Bruno me procurar, vou pedir para ele me levar a eles. Quero conversar, saber e se possível, ajudar. Essa reflexão impõe uma resposta, uma idéia do porque, assim que eu a tiver, com certeza a relatarei aqui também. Desejem-me sorte.

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Luiz Mendes

22/10/2014.

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